Permita-me o eventual curioso deste malaventurado blog que eu lhe proponha uma questão de puro bom senso: suponhamos que uma centena de homens e mulheres, que tempos atrás morriam de sífilis ou de tuberculose, morram hoje em dia esmagados num acidente de um avião a jato arrebentado contra uma montanha.
Será que o fato de a sífilis ou a tuberculose ser controlada e de ser possível viajar numa aeronave a jato traz alguma diferença em relação às suas mortes?
Ou, se a técnica significa segurança e a vida é fácil e seguramente prolongada, as viagens de avião menos perigosas e assim por diante, que diferença isso faz numa sociedade congestionada, irracional, frustrada, cheia de tédio, em que todos por isso mesmo acalentam um desejo agudo e patológico da própria morte, e que existam ainda armas ao seu dispor e que poderiam realizar esse desejo de modo rápido e fulminante?
O que estou dizendo, portanto, é que não faz nenhum bem conseguirmos progressos fantásticos em todos os setores da vida moderna, se não sabemos viver com eles, se não sabemos utilizá-los sensatamente e se, em realidade, nossos conhecimentos técnicos se transformam em nada mais do que um modo dispendioso e complicado de desintegração moral e cultural.
Alguém poderá dizer que não é "bonito" pensar nessas coisas, nem sequer nas suas possibilidades. Mas são possibilidades reais, e não são tomadas em conta frequentemente com inteligência e prudência. Causam de vez em quando uma certa emoção, mas logo são varridas da memória.
Todavia, queiramos ou não, permanece o fato de que criamos para nós mesmos um tipo de cultura que ainda não pode ser vivida pelo conjunto da humanidade.
Nunca, como hoje, houve uma tal distância entre a miséria abjeta dos pobres, em nossas favelas, e a absurda opulência dos ricos nos bairros nobres de nossas metrópoles.
Algumas medidas que os poderes públicos tomam para remediar tal situação parecem bem intencionadas, mas quase totalmente ineficazes. De muitos modos só fazem piorar as coisas quando, por exemplo, neste nosso Brasil das arábias, os que supostamente deveriam receber os benefícios a eles devidos, percebem claramente que na realidade a maior parte desses benefícios vai para o bolso de políticos corruptos. Sem esquecer que esses mesmos políticos corruptos procuram manter o "status quo", do qual a miséria dos pobres é parte essencial.
O fato de que em tempo de eleições a maioria desses políticos proclama por todos os meios de divulgação, como um artigo de fé, que estão numa posição francamente favorável para resolver todos esses problemas, acredite quem quiser - mas para mim não passa de uma deslavada mentira.
O mais trágico, porém, é que muitos eleitores embarcam ingenuamente nessas promessas mirabolantes, tão comuns nestes nossos tempos de tanta embromação política institucionalizada.
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