segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

"...CHEGOU O TEMPO DE DAR PRESENTES"



             Os que ignoram o significado espiritual do Natal dizem que Natal é tempo de dar presentes... Presentes para a esposa, para os filhos, para os parentes, para os amigos, para todos aqueles que nos podem abrir uma porta para o êxito social ou profissional.
            Aliás, estou sabendo que o vizinho da esquerda diz que já comprou, a da direita me jurou que vai comprar. É praxe. É costume. É prova de boa educação e sociabilidade.
            Todo mundo fica contente por entrar na equação de um costume, de uma praxe. De se mostrar gente fina  e bem educada.
            E trocam-se cumprimentos efusivos. E dão-se tapinhas amigáveis nas costas. E permutam-se presentes. E ouvem-se risos de satisfação e gritinhos de prazer, em meio a todo um misto de sofisticação e artificialismo, numa sociedade sofisticada, artificial e egoísta.
            Sociedade egoísta sim. Pois não é Natal? E Natal não é festa dEle?
            Mas a Bíblia Sagrada nos diz que Ele veio para o que era Seu, e os Seus não O receberam. São palavras do  evangelista João.
            Não há lugar para Ele na hospedaria. Negam-Lhe um lugar à mesa, entre a alegria de homens e mulheres que festejam a data, mesmo ignorando seu verdadeiro significado.
            Com que eloquência fácil seria possível ampliar esta frase desoladora. Não há lugar para Ele. Nem na família, nem na escola, na política, na fábrica, nas instituições públicas, nem no fundo das almas pecadoras.
            No entanto, Ele vem para todos.  Chegada a plenitude dos tempos, Ele toma carne de homem, nasce de mulher, veste-se de pobre e bate  a cada porta, pedindo um lugar à mesa. Escorraçam-No, lançam-No para fora, pois a festa precisa continuar. Aí está a orquestra a todo volume já animando o salão, a champanha e o uísque importado ou falsificado amenizando o gelo dos corações e desfazendo naturais inibições.
           Que Ele apareça outro dia. Será que Ele não percebe que está nos constrangendo, nos inibindo, nos tirando a espontaneidade para um evento social?
           Não, é melhor mesmo que Ele se vá. Talvez O recebamos em outra ocasião...
           Ele continua Sua solitária jornada noite a dentro. Ele sabe que o mundo, apesar de sua aparência festiva e multicolorida, é um mundo muito doente. Doente do coração, doente de  desamor.
           Ele sabe que os mesmos homens e mulheres que agora O escorraçam, amanhã pronunciarão Seu santo nome na tentativa de justificar uma ordem social, política e econômica que dizem ser "cristã". Outros colocarão o símbolo de Sua vitória, a Cruz, nos lugares onde o pobre é escarnecido pela filantropia mecânica e legalizada, ou onde a Justiça e o Direito são vilipendiados pela força do dinheiro ou dos interesses inconfessáveis.
           Mas Ele não desanima. Prossegue imperturbável a Sua peregrinação, pois sabe que outros, muitos outros, aqui e em todo o mundo, não hesitam em jejuar, passar uma noite em oração, privar-se do necessário ao repartir seu pedaço de pão com o irmão faminto, na esperança talvez utópica de abrir um espaço para Ele, entre os companheiros que agora O rejeitam.
           Ele sabe que entre as pessoas com quem cruza pelas estradas e ruas, - nos seus rostos convencionais e tristes, nos seus gestos automatizados, no olhar que se desvia, na palavra que se engole, - Ele sabe que aí poderá haver ainda Fé e boas ações. A seara hoje parece resumir-se num cipoal de espinhos e joio, mas Ele, ceifeiro celeste, um dia percorrerá de novo os campos e recolherá o punhado de trigo bom que puder conseguir entre as urtigas.
          É que Ele conta de modo diferente dos homens e das mulheres. E é nessa certeza que colocamos nossa esperança.
          Com este espírito e nessa esperança, minha esposa Cleusa, minha neta Isabela, e eu, desejamos um santo e feliz Natal, com as bênção benfazejas do Menino que vem, a todos os leitores deste meu modesto blog!
           Feliz Natal e um venturoso ano que vem por aí!

                                                              ******************

            
           

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

PINGOS E RESPINGOS



          *** O Deus de minha Fé não é o Deus que  muda as leis da Natureza a Seu bel prazer ou segundo Suas conveniências, nem que desatenda as súplicas de Seus filhos - que somos todos nós, humanos - ainda que sejam justas, como acabar com a fome no mundo, mandar a chuva tão necessária para nós, ou curar nossas doenças físicas ou emocionais..
          *** Este nosso Deus é, antes de tudo, amor. É o grande companheiro que está com o enfermo, e não com a enfermidade, contra a qual, aliás, Ele nada pode fazer, porque ela permanece na esfera autônoma da Natureza, que Ele respeita.
          *** O homem e a mulher de Fé, e o ateu, não habitam mundos diferentes, simplesmente habitam de maneira diferente um só e o mesmo mundo. Ambos vivem a mesma vida, só que a vivem de modo também diferente.
          *** A bondade de Deus é tão universal, que não exclui ninguém, nem sequer os maus: faz nascer o sol igualmente sobre maus e bons, sobre justos e injustos. Por isso, perdoa sempre, eis o ponto de, como o pai da parábola  do filho pródigo testemunhado pela Bíblia sagrada, não castiga nem repreende, mas alegra-Se e faz festa pelo regresso do filho à casa paterna.
          *** Aquilo por que Deus Se compraz no homem e na mulher é tudo, enquanto realização positiva do ser. Literalmente, tudo, corpo e alma, cultura e alimento, trabalho e religião. Aliás, Deus não é nada religioso, porque religião é amar, pensar e servir a Deus, mas o Pai de Jesus de Nazaré e Nosso pai também, não pensa  em Si mesmo nem busca ser servido. Ele pensa em nós e busca exclusivamente nosso bem.  Não quer servos nem incensários que proclamem Sua glória. Busca-nos a nós mesmos, deseja nossa felicidade. Para isso criou o mundo e o entregou em nossas mãos.                                                                                                                                                                                 *** Diante dos sofrimentos angustiantes de minha filha Raquel nos quatro anos de sua doença e na agonia atroz por que passou num leito de hospital, me custou muito tentar convencê-la de que Deus nos criou por amor gratuito de pai.
         *** Confesso francamente que hoje, na sua ausência dolorosa dentre nós, que em muitos momentos sou tentado a não  crer mais nesse amor de Deus por nós, diante de tudo o que ela sofreu.
         ***   Que Deus me perdoe, e que tenha minha inesquecível filha Raquel no Seu Reino de Amor e de paz, por toda a Eternidade!
                                                                                                                                           


                                          Minha filha Raquel, que te partiste
                                           tão cedo, desta vida, descontente,
                                          descansa lá no Céu, eternamente,
                                           e  fique eu cá na Terra, sempre triste.
                                          
                                           Se lá no Assento Etéreo aonde subiste
                                           lembrança desta vida se consente,
                                           não te esqueças daquele amor ardente
                                           que em meus olhos de pai tu sempre viste.

                                           E se vires que podes merecer-te
                                           alguma coisa a dor, que me ficou
                                           da mágoa sem remédio de perder-te,

                                           roga a Deus, que teus anos encurtou,
                                           que tão logo daqui me leve a ver-te,
                                           quão cedo de meus olhos te levou!

                                                             **********

      ***   Saudades de tua mãe Cleusa, de teu pai Aroldo, de teus irmãos Carlos e Aroldo Jr

                                                             **********

                                          

                                          
                                          

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

POLÍTICA, POLÍTICOS E... POLITIQUICES!



            As eleições municipais cá no meu Paraná chegaram e passaram. O Greca, para purgação dos meus pecados mortais, está aí de novo, com a mesma cara, o mesmo risinho  meio torto, e as mesmas palavras de sempre.
            Seus adversários, derrotados, botaram a viola no saco e foram cantar em outra freguesia. Os eleitos, Fruet e apaniguados, alvorada de esperança para aqueles que neles votaram, ao tomarem posse de seus cargos, no executivo e no legislativo, dirão que estão com as melhores intenções, e que darão o próprio sangue, se for o caso, para honrar o mandato recebido do povão. Acredite quem quiser, ou que for trouxa...
             Os eleitores (eu, há muito tempo, não o sou mais, em protesto contra a politicalha) mal ou bem, sentem-se com a consciência tranquila pelo dever cívico cumprido. Votaram num dos candidatos apresentados. Alguns por amizade, outros por obrigação ou civismo. muitos pelas sempre benfazejas propinas.  Depois voltam para casa. Talvez não pensem mais em eleições, em votos e propinas, até as próximas eleições.
            Sei que muitos eleitores pensam que o dever ou o direito do votante é apenas votar e depois ir para casa, tomar uma cervejinha, e dormir, achando que o voto, uma vez colocado na urna ou digitado, faz terminarem as suas obrigações de cidadão consciente.
            Ledo engano, penso eu, abotoando o último botão ainda inteiro de minha ceroula samba-canção. Homem e mulher são seres políticos, pela sua própria essência de pessoa. E o ato de votar é um instrumento, uma ferramenta, para o efetivo exercício dessa sua obrigação cívica.
            Assim como homem e mulher sabem que têm consciência de que devem trabalhar para viver, devem também ter consciência de que são de certa maneira responsáveis pelo destino da Nação, do Estado, do Município.
            Devem saber que têm responsabilidade muito séria pela escolha que fizerem ao votar. Saber que eles, como cidadãos, têm a mesma responsabilidade que aquele que ajudaram a eleger-se. Responsabilidade de se reunirem com os demais eleitores da sua comunidade, fiscalizarem, discutirem o que está certo e o que está errado na atuação do eleito,
            Pessoas que pensam que os políticos eleitos fazem as coisas por favor, estão sem consciência de sua força de cidadãos. Os políticos eleitos têm obrigação de trabalhar pelo povo. É para isso que se candidataram,  foram eleitos, e são pagos com o suado dinheirinho do povo.
           Diz a Lei:
           -"Todo poder emana do Povo e será exercido em nome do Povo."
           As pessoas, as famílias, os clubes, os sindicatos, as associações esportivas, as entidades civis e religiosas, formam aquilo que se convencionou chamar de sociedade civil. Sozinhos, porém, não podem realizar o Bem Comum. Por isso é que existe uma comunidade maior, em que todos se empenham para alcançar o bem de todos. É o que chamamos de comunidade política.
           A comunidade política deve facilitar o bem-estar das pessoas, das famílias, dos vários agrupamentos sociais, tendo em vista a realização do Bem Comum. Política não é assunto só de gente grande, de ricos, de poderosos. Política é coisa muito boa e séria. O que não presta é a politiquice, a politicalha. Ao politiqueiro só interessa o "venha a nós."  Fica bancando pose e achando que é o senhor de tudo. É assim o mau político.
           Ele assume o poder, que lhe veio do povo, para perseguir os adversários, para legislar em proveito próprio, para construir uma sociedade egoísta que só favorece aos seus parentes, aos seus amigos, aos seus apaniguados. É aquilo que o povo chama de fisiologismo
           O mau político não sabe o que é Bem Comum. Pensa que é o dono do Poder.
           Voltarei ao assunto, com mais vagar.

                                                     *************************
                

           
          

      

sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

ORAÇÃO DA MANHÃ


                                           BENDITO SEJAS, MEU PAI


                                               Pela sede
                                              que despertas em mim,
                                              pelos planos arrojados
                                              que me inspiras nesta manhã,
                                              pela Graça que és Tu mesmo
                                              crepitando em meu coração

                                             
                                                                 Que importa
                                                                 que a sede que me tortura
                                                                 fique dia e noite insatisfeita?...
                                                                 (Ai dos saciados!)


                                             Que importa
                                             que meus sonhos de perfeição
                                             que tu infundes em mim
                                             fiquem mais no desejo
                                             do que na realidade
                                             por minha culpa
                                             pela minha máxima culpa?


                                                               Quem sabe mais do que Tu
                                                               meu Deus do Céu
                                                               que a minha salvação
                                                               independe de mim
                                                               e que Tua misericórdia
                                                               só me pede com insistência
                                                               o máximo da minha entrega a Ti
                                                               e sempre com boa vontade?...


                                           Bendito sejas, meu Pai
                                           pela Tua Graça benfazeja
                                           que me trará a salvação
                                           na eternidade do Teu Reino!

                                           Meu "muito obrigado", meu Pai!


                               ***************************************************


                                                        



                                                     

sábado, 26 de novembro de 2016

A MENINA QUERIDA DE TODOS NÓS



            Depois de muita procura, consegui encontrar numa de nossas livrarias o texto integral do "Diário" de Anne Frank, a pequenina judia  de treze anos, que morreu, juntamente com sua irmã Margot, nos horrores de Bergen-Belsen, o campo de concentração nazista. Aí também encontraram a morte nos fornos crematórios e nas câmaras de gás milhares de prisioneiros judeus deportados de várias regiões da Europa, na segunda guerra mundial.
             Uma ressalva: Anne Frank morreu de morte natural, vitimada pelo tifo, devido às péssimas condições higiênicas do campo. Sua mãe e a irmã Margot morreram nas câmaras de gás. Seu pai sobreviveu, e passou o resto de sua vida divulgando o "Diário"  da filha por toda a Europa.
            Alguns dias antes de morrer Anne Frank escreveu  em seu Diário esta frase, cujo espírito perpassa por todo o livro:
            - "Verdadeiramente minha vida mudou, e para melhor, porque Deus não me abandonou e não me abandonará jamais."
            Estas palavras me fazem lembrar  daquelas outras proclamadas não pelo Deus de Israel, mas por Seu Filho, tornado homem na Terra, para assumir a condição e os sofrimentos de homens e de mulheres, bem como dar a eles e a elas um novo sentido à sua Esperança:
            - "Deixai vir a mim os pequeninos."
            Apesar de saúde frágil, marcada por sofrimentos horríveis nos meses de cativeiro, a alma juvenil de Anne Frank era daquelas que, desde sempre, responderam às palavras de Jesus de Nazaré
- Deus nunca a abandonou.
            Naquele campo de torturas e mortes de Bergen-Belsen, com seus fatídicos fornos crematórios nos quais muitíssimas vezes ela contemplou horrorizada centenas de crianças judias chegando em pesados caminhões e sendo atiradas às chamas pelos soldados nazistas, é preciso confessar que este Deus Anne mal conseguia defini-Lo. Entretanto, Sua imagem estava presente sempre no coração da pequena Anne, e nunca haveria mesmo de abandoná-la, até seus derradeiros dias de vida, como nos comprova o Diário.
            E eu o creio, tendo-o lido uma dezena de vezes, intuindo que o Deus de Israel, o "Abbá/Pai-Mãe" de Jesus de Nazaré, que  também é Pai-Mãe de todos os torturados pela barbárie nazista, e continuam sendo torturados ainda hoje em vários recantos deste nosso planeta. No mais profundo de nossas fraquezas humanas, no recesso mais sombrio  de nossas angústias e revoltas, a pequenina Anne representa para nós  uma das mais eloquentes imagens da nossa Esperança Teologal.
            Ela, que se considerava um nada, conseguiu romper a muralha de silêncio culposo  das várias religiões para mostrar ao mundo inteiro, nas páginas de seu Diário, a chaga sangrenta das deportações e do extermínio metódico dos judeus - homens, mulheres e crianças - nos campos de concentração. E pensar que nós, no Brasil, estivemos bastante próximos dessa nefasta ideologia nazista, na sua versão tupiniquim do integralismo de Plínio Salgado, cópia mal feita do fascismo de Mussolini, aliado inconteste de Adolf Hitler...
            O Prêmio Nobel da Paz de 1958, o Padre Pire, deu à sua sexta aldeia  europeia, que acolhia os refugiados de todos os cantos da Europa, o nome  de Anne Frank, a menina querida de todo o Mundo.

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

A IGREJA, AS IGREJAS E A POLÍTICA



            Num texto que publiquei recentemente, em tempo de eleições, afirmei que as igrejas, tanto a Católica, quanto as assim ditas Evangélicas, não deveriam identificar-se com qualquer sistema político ou econômico, pois isto não é competência das igrejas. Cuidar da justa ordem da sociedade civil e do Estado é tarefa da Política.
            No âmbito da Igreja Católica - (sou católico pela Graça de Deus) - o Concílio Vaticano II, em um de seus documentos oficiais, proclamou solenemente a autonomia das realidades temporais terrestres, cuja incumbência pertence, de direito, ao Estado. Nestes termos, também o Estado não deve imiscuir-se no plano espiritual e das consciências,  que é campo exclusivo das igrejas.
            O Estado não pode impor a religião a seus súditos, mas, isto sim, garantir a liberdade de crença e a paz entre os praticantes das diversas religiões.
            O objetivo e a medida intrínseca da Política é a promoção de uma ordem justa na  sociedade, em todos os diversos setores. A Política é mais do que uma simples técnica para a definição dos ordenamentos políticos , como quer que se queira defini-la. O pensamento social católico não pretende nem pode conferir à Igreja poder sobre o Estado. Ela deseja e deve simplesmente contribuir para a purificação dos objetivos políticos e prestar a própria ajuda para fazer que tudo quanto for justo possa, aqui e agora, ser reconhecido e realizado para o Bem Comum da sociedade.
            As igrejas não podem nem devem tomar nas próprias mãos a batalha política para realizar uma sociedade mais justa e consentânea com o Bem Comum. Mas também não podem ficar em cima do muro quando  se trata de luta pela justiça e pela paz social.
            Na esfera política, o dever imediato de trabalhar por uma ordem justa na sociedade é próprio dos leigos, e não das igrejas como instituição. Os fiéis de qualquer igreja, como cidadãos do Estado, são chamados a participar pessoalmente da vida pública, de uma ou de outra maneira. Eles não podem abdicar da múltipla e variada opção econômica, social e legislativa, executiva e cultural, destinadas a promover orgânica e institucionalmente o Bem Comum.
            A missão do fiel de qualquer igreja, dentro das realidades terrestres e temporais é configurar retamente a vida social, respeitando a sua legítima autonomia e cooperando, segundo sua competência e responsabilidade, com os demais cidadãos. E sempre, como pessoa religiosa, deve sentir-se animado pela Caridade Cristã, e sua vida pública deve ser vivida como Caridade Social porque, homem e mulher, além da Justiça, têm e terão sempre a missão de  viver e realizar plenamente o Amor.

                                                   ****************************

Aroldo Teixeira de Almeida é professor aposentado de Português e Francês, do Quadro Próprio do Magistério Paranaense, e bacharel em Teologia Dogmática, pela Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, da Capital paulista.

                                                 

domingo, 30 de outubro de 2016

A COMEMORAÇÃO DE NOSSOS MORTOS INESQUECÍVEIS


          Neste mês de novembro, entrante, temos um dia dedicado aos nossos mortos, aqueles que nos precederam na entrada da Casa de todos os pais. É o dia em que, de maneira toda especial, rezamos por eles, para que descansem em paz no Reino de Deus.
           Rezamos pelos mortos. Está correta esta prática, é ela fundamentada na Palavra de Deus, como encontramos na Bíblia Sagrada.
           "Há pecado que conduz à morte, e por esse não digo que orem."  (1 Jo 5, 16). "... O salario do pecado é a morte."   (Rm6,23. "...e há pecado que não é para a morte". (leve, venial)   (IJo 5,17).  
           Pelos filhos e filhas de Deus, cujo pecado evidentemente , "...não é para morte", e pelos que morrem de coração contrito, se pode e se deve orar.
          O livro dos Macabeus, no Antigo Testamento, ordena a oração pelos mortos, dizendo: -É um santo e salutar pensamento este de orar pelos mortos". (2Mc 12,42-45).
          Cristo,   por Sua vez, nos admoesta:  "Reconcilia-te com teu adversário para não caíres na prisão, pois não sairás daí, enquanto não pagares o último ceitil" (Mt, 5,25-26). -"Mas o pecado contra o Espírito Santo não terá perdão nem aqui nem no outro mundo." (Mt 12,32).  "Na verdade, eu vos digo que quem ouve a minha palavra, e crê nAquele que me enviou, tem a vida eterna, e não entrará em condenação, mas passará da morte para a vida". (jo 5, 24).
           A caridade fraterna, mediante o Cordeiro de Deus, apagará realmente uma multidão de pecados (1Pd 4,8). São palavras que nos ensinam que as graças de Deus circulam em todo o corpo: -"Ora, vós sois o corpo de Cristo" (ICor 12,27). E porque circulam as graças no corpo místico de Cristo, os justos que morrem com o pecado que não é para a morte (IJo 5,17) ou que ainda não satisfizeram plenamente o estado do pecado já perdoado, são assim perdoados mediante Cristo.
           Na verdade a Igreja triunfante no Céu, como também a Igreja peregrina na Terra, num só corpo auxiliam mediante o sangue do Cordeiro, na comunhão dos santos, uns aos outros, principalmente os que ainda necessitam  satisfazer alguma purificação, conforme a doutrina católica, no assim dito Purgatório, biblicamente "prisão"  ou "fogo purificador".
            Purgatório, conforme a Bíblia Sagrada, é sinônimo de "prisão", ou de travessia de um " fogo" purificador. Não é punição nem castigo de Deus, mas uma exigência purificadora do próprio amor da criatura imperfeita diante do amor perfeito de Deus ( Is 33,14). É uma questão de justiça, "...esperamos novos céus e nova terra, nos quais habita a justiça" (2Pd 3,13).
            Pela graça de Deus, o Purgatório (que não é aceito pelos assim ditos protestantes)  não é inferno em miniatura, mas um estado de aperfeiçoamento final, rumo ao Céu. Nele a pessoa se purifica do "...pecado que não é para a morte" (IJo 5-17), ou dos pecados "veniais", passando, então, definitivamente, para a feliz eternidade no Céu.
            Lembro que na comemoração de nossos mortos, nos cemitérios, há desperdício e exagero no uso de velas, flores e coroas, que poderiam muito bem ser substituídas por esmolas ou doações a entidades de beneficência. Aqui, como em outros casos, o que é nocivo é o exagero, e não os símbolos  e a comemoração como tais.
             Que minha filha Raquel e meu filho Júlio, ambos sepultados no "Memorial da Saudade", em Curitiba, descansem na Paz do Senhor, à espera da feliz ressurreição dos mortos!

                                                            **********************

             

          

terça-feira, 25 de outubro de 2016

BREVE MEDITAÇÃO SOBRE A FÉ


            Se quase já não há mais cristandade como em séculos passados, em compensação há cristãos. E cristãos escolhidos, conscientes, que preparam o futuro em segredo.  Que os haja em todas as nossas comunidades, cristãos fervorosos, atuantes,   levando uma vida espiritual e fraterna, mais rigorosa que a de nossos antecessores, é já uma esperança e  uma alegria.
            Quanto mais no plano dos conjuntos  institucionais, a apostasia parece planetária, no plano das comunidades populares, como nas comunidades eclesiais de base, a Fé se mostra viva e atuante. Graças sejam dadas a Deus porque, verdadeiramente, é um milagre: o milagre da Fé.
            Dediquemos alguns instantes desta manhã para uma ligeira meditação sobre a Fé.
            A Fé é sempre um caminho a percorrer e uma conquista a realizar no dia a dia do cristão.
            A Fé é sobrenatural, livre e racional.
            É sobrenatural porque, no começo, no  meio e no fim, é sempre o apelo de Deus que solicita homem e mulher, os ampara e os faz chegar à Fé.
            É livre, porque, sem o consentimento  da vontade, nem todo o oceano da divindade conseguiria  abrir as portas de nosso tabernáculo interior.
            Enfim, é racional porque, no começo, no meio e no fim, o ato de Fé é uma atividade eminentemente digna da inteligência humana.
            A primeira responsabilidade de um homem e de uma mulher de Fé consiste em  fazerem de sua Fé  uma parte importantíssima da vida, não para discuti-la, mas para vivê-la em todos os instantes do seu dia - a dia.
           A Fé, para ser viva e atuante, necessita de uma contínua atualização, pois somente assim deixa de ser algo abstrato, para converter-se em experiência pessoal e efetiva.
           O homem de Fé e o homem ateu não habitam mundos diferentes: simplesmente habitam de maneira diferente um só e o mesmo mundo.
          Ambos vivem a mesma vida concedida a eles por Deus, só que a vivem de modo diferente.
          E é muito importante esta verdade:
          A Fé, sobrenatural, racional e livre, amadurece no dia-a-dia do silêncio e da oração.

                                                    ************************

   

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

"...e por falar em macacos!"



            Folheando um caderno antigo, repleto de anotações vadias, encontrei nele recortes de jornais onde se dizia que os americanos conseguiram colocar um macaco no espaço. Diante deste inaudito fato, eu fiquei matutando com os três botões ainda inteiros da minha ceroula samba-canção: -  por que raios tanto espalhafato por um mísero macaco voando em torno deste nosso mundo já avacalhado em demasia pelos humanos?
           Qual a finalidade de botarem o pobre bicho no espaço? O  que iria ele fazer lá nas alturas? E esta interrogação ainda mais patética: será que conseguiriam trazê-lo de volta à Terra são e salvo?
            Pois é; diziam ainda os jornais que o quase nosso irmão macaco voou (?) pelo espaço a uma velocidade fabulosa, apertando botões e mais botões, esquecido até de comer a sua fruta predileta, a banana, de que certamente os técnicos da NASA abasteceram com prodigalidade a nave espacial...
            E lá foi ele, cumprindo a sua espinhosa missão, que era enviar mensagens para a Terra, com regularidade impecável, tal como fora amestrado pelos seus treinadores.
            Com toda certeza o macaco não se queixou de estar lá em cima. Não se queixou nem da Terra nem do Céu. Ainda mais: não foi importunado por nenhum problema metafísico por estar a milhares de quilômetros de seu habitat natural. Pelo menos os jornais não noticiaram nada a esse respeito.
            Aliás, por que haveria um macaco de sentir-se culpado no espaço que, me disseram na escola, é o lugar onde não há nem peso nem culpabilidade? E eu me questiono, com ou sem razão, quem dera que nós, humanos, cá na Terra, tivéssemos também a glória macacal de nenhum sentimento de culpabilidade!
             Quando chegamos, já há algum tempo, na Lua, talvez lá sentíssemos um tanto quanto culpados, diante da imensa quinquilharia com que a sujamos por meio de nossos foguetes espaciais!...
              É verdade que talvez nos sintamos um pouco culpados se chegarmos em Marte, que os antigos diziam ser o deus das guerras, essa atividade de que os humanos tanto gostam de praticar...
              Trá-lá-lá. Apertar botões. Saborear balas de bananas. Puxar alavancas. Girar em altíssimas alturas e velocidades em torno da Terra bem-amada!...
               Pois é, não sei se isto foi honroso ou não para mim, pois aconteceu no dia em que fiz quarenta e seis anos de idade. Vamos ser pessoas perfeitamente sérias. A tão decantada Civilização Moderna se dignou agraciar meu quadragésimo sexto ano com este feito memorável: botar um macaco no espaço - e eu deveria ficar magoado com isso?
               Deixem-me aprender com esse malfadado macaco alguma coisa a mais do que já sei: apertar botões. Puxar alavancas. Subir quase até ao infinito. Contemplar das alturas a pequenez da Terra.
               Como isto não fez nenhum mal ao macaco, não fará mal também para mim. Ele sentiu-se animalescamente feliz.  Pois foi pescado são e salvo no Oceano Atlântico. E em agradecimento, dizem-me os jornais, apertou as mãos do pessoal da gloriosa Marinha Américana que o resgatou do mar!...

                                                    *******************************



           

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

A MOSCA AZUL


          " Ele a encontrou à sombra de florido flamboyant, no jardim da cidade.
           Ignoro se esse encontro lhe trouxe alguma transformação para o futuro. O que posso afirmar com plena certeza, é que, nos rápidos momentos em que ficaram juntos, ela lhe proporcionou instantes de indizível felicidade".  

                                                ****************************

            Jovem camponês, filho de pequeno proprietário rural que teve suas terras leiloadas para cobrir dívidas de financiamento bancário, ao rapaz não sobrou outra alternativa a não ser deixar a enxada e o arado e vir tentar a sorte na cidade grande.
           Chegou há três semanas, com algumas moedas no bolso de brim barato e um incêndio de boas intenções na cabeça.
           As avenidas rumorosas, a agitação poliforme, o trânsito desenfreado, o imprevisto e o inesperado assaltando-o a cada esquina, os odores diferentes, as roupas desinibidas e insinuantes das mulheres -  coisa que não existia na roça -, o maravilhoso das vitrinas e dos logradouros urbanos, a cidade inteira alucina-o numa alegria deslumbrada.
            Na sua ingenuidade de recém-chegado, julga fáceis todas as coisas, abertas  à sua frente todos os caminhos. Nesta ilusão perigosa, procura emprego com as mais fagueiras esperanças.
            Vê, porém, frustrados, todos os seus anseios. Ou porque sua aparência não fosse lá bastante atrativa, ou porque a vida está mesmo apertada, o certo é que não conseguiu nenhuma colocação.
            Assim, correm os meses: as refeições vão se encolhendo até se tornarem em sanduiches, a cara da dona da pensão vai-se fechando a cada dia que passa. Coisa trágica!
            Nesse dia o moço resolve dar o milésimo giro pelo centro comercial, a ver se tem mais sorte desta vez. Aventura-se por um supermercado. Fala com o gerente. Oferece os seus serviços.  O gerente não o conhece. O candidato não tem referências. Ademais, o salário mínimo subiu, os consumidores retraíram-se, a recessão bate às portas, a crise financeira assusta todo mundo, o Temer diz que é necessário cortar na carne e, com isso, irá para a rua um milhar de desempregados. Voltasse outro dia. Talvez até lá surgisse alguma novidade.
            Desengano maldito!
            O pobre se atira a todas as casas comerciais. Todas elas têm gente de sobra. Todas dizem que a tal política econômica do governo acirrou a concorrência com os produtos importados,   as empresas estão operando no vermelho, e que por isso são obrigadas a comprimir despesas, não precisam de mais funcionários. Oficinas, bares, lojas de confecções, postos de gasolina, até mesmo um motel procurado, tudo a mesma desculpa.
            E pelas calçadas cheias de gente, na fria Curitiba, frustrado, arrependido de ter vindo para a cidade grande, caminha o infeliz na sua lentidão desiludida, coração opresso, até que, cansado, se atira nos braços acolhedores de um banco de jardim, ali na Rua das Flores.
            Foi então que ela chegou.
            E chegou faceira, cativante, ostentando suas graças e donaires  na sedução irresistível das formas bem feitas. Como era linda! Encantadora mesmo! Se o rapaz estivesse em dia com as novelas da televisão, diria que ela estava tentadora. Não conhecia essa linguagem, não tinha TV, por isso se limitou a contemplá-la, embevecido, em muda admiração, pois nunca em sua vida ele vira uma beleza igual.
            E a borboleta - pois era uma linda borboleta - dessas grandes e douradas, atraída pelo perfume de rubicunda rosa, voava e tornava a voar, descomprometida, fazendo brilhar ao sol as suas asas de cetim.
            O divorciado da sorte deixou-se estar a contemplá-la, na plácida modorra de um faquir. E então, aos seus olhos incrédulos, por entre as translúcidas asas da borboleta a volitar, parece-lhe surgir tênue fumaça, que pouco a pouco se vai adensando, até formar um rosto... e este rosto é o seu!
            Nessa fantástica miragem, vê-se o rapaz transformado em grande ricaço, a exibir o fausto e a ostentação de uma situação privilegiada. A cada volteio  da insinuante borboleta, mais e mais o jovem se aprofunda no seu êxtase. É agora dono de rico  e majestoso palacete num condomínio fechado, centro de reunião e de suntuosas festas da fina flor da sociedade local.
            Suas emoções crepitam. Passam-se minutos, que lhe parecem séculos, num deslumbramento de riquezas nunca jamais possuídas. Diante dele espelham-se, realizados, todos os seus mais ardentes desejos, e ele se vê na companhia de outros rapazes, de muitas e muitas moças maravilhosas, simpático, atraente, e com aquele ar desdenhoso e distante da abastança regalada!
            As translúcidas asas da borboleta dourada transformam-se, para o feliz sonhador, num televisor gigantesco, onde as imagens alegres do mundo se sucedem sem parar. O mundo está delirante, as pessoas cada vez mais belas e encantadoras, a cidade sempre mais cheia de magia, e ele entre tudo isto! Que delícia! Como é bom viver!
            O rapaz sonha. Está no auge de sua felicidade, com todos os seus desejos satisfeitos, apaixonado de todas as mulheres, possuidor de todas as comodidades da vida, fruindo todos os prazeres e luxos que só o dinheiro proporciona, quando um estudante, que enforcara as aulas, corre para ela, persegue-a, alcança-a, dá-lhe com o livro, derruba-a na grama verde do jardim. E derruba, com ela, também, as falazes quimeras do sonhador!...

                                                       ************************

             O pobre moço vê destruída, de um golpe, toda a sua felicidade. Já agora o tortura o aguilhão da fome. Procura alguns centavos no bolso. Nada. Vazios.   
              E melancólico, frustrado mais uma vez, roendo dolorosamente as unhas maltratadas, ergue os olhos para o horizonte longínquo, procurando nele, quem sabe, uma outra borboleta dourada que venha lhe trazer, por mais alguns instantes, outros retalhos de mentira à sua vida inútil e miserável!
                                                    
                                                     *************************

              (PS: Às vezes tenho a terrível impressão de que este pobre moço sou eu mesmo!)

                                                     *************************





     



              

terça-feira, 13 de setembro de 2016

DÍVIDA DE GRATIDÃO

DÍVIDA DE GRATIDÃO

DÍVIDA DE GRATIDÃO



            Não é um discurso, que não sei fazê-lo. São apenas algumas palavras alinhavadas às pressas, mas cheias de emoção incontida, com as quais procuro saldar uma antiga dívida de gratidão. Minha consciência clamava incessantemente para que eu pagasse esta minha dívida, mas as contingências da vida sempre me impediam que eu a implementasse. Agora, porém, livre dessas contingências inoportunas,  foi-me possível saldar este compromisso de gratidão. E eu o faço com grande alegria.



                                                   ***********************************



            Numa noite chuvosa de dezembro de 1963, da velha "jardineira" que fazia o percurso Jandaia do Sul-Barbosa Ferraz, descia um peregrino carregando pesada mala abarrotada de livros e algumas peças de roupa. Foi bater à porta do Hotel Central, pedindo alívio para seus ossos cansados da longa viagem.
           Pois é. Esse peregrino, por mal dos meus pecados de bisonho escrevinhador, sou eu mesmo, e  lembro-me muito bem que o hoteleiro, ao receber-me na portaria, trazendo nas mãos uma vela acesa, pediu-me desculpas pela parca iluminação, informando que o gerador  de eletricidade para o hotel estava com defeito, daí a falta de energia elétrica no local.
            O peregrino recém-chegado, "vida aos pedaços pelo mundo repartida", parodiando verso famoso dos "Lusíadas" de Camões, deixara atrás de si, na capital paulista, conflitos ideológicos e políticos, incompreensões de superiores imediatos, agitações estudantis e sindicais, e viera procurar refúgio e tranquilidade no Paraná e, por feliz casualidade, chegou a Barbosa Ferraz. Esse peregrino sou eu, que agora me identifico, pedindo desculpas pelo tempo de leitura que de vós eu tomo.
            A cidade, hospitaleira como toda cidade interiorana, abriu-me suas portas na pessoa de meu tio Juca de Farias, em sua residência de madeira no sítio às margens do Rio Corumbataí, nas proximidades do assim dito "salto". Esta é a primeira parte de minha inadiável  dívida de gratidão.
            Nas pessoas de meus parentes Alcy de Farias, Benedito Aparecido de Farias, Glória de Farias e Odete de Farias, desejo levar ao meu tio Juca e à minha tia Laurinda, ambos agora já no Reino do Pai de todos os pais, a minha imorredoura gratidão pela acolhida desinteressada e fraterna que me proporcionaram durante os meses em que permaneci em sua morada.
            Minha gratidão, em seguida, ao senhor Alberto Tokarsky, prefeito na época, o qual, tomando conhecimento de minha presença no município, e sabendo também que eu fui professor em São Paulo, incumbiu os também professores Carlos Caslavski e Eiji Yassaka a me procurarem no sítio, oferecendo-me a cadeira de Língua Portuguesa na Escola Normal de Grau Ginasial, por onde iniciei minha carreira no magistério, e na qual me aposentei após trinta anos ininterruptos em sala de aula.
            Nesta minha jornada de gratidão, não posso me esquecer dos veteraníssimos professores Carlos Caslavsky, Eiji Yassaka, seu irmão doutor Ossama, dona Laura Pinto de Oliveira, Francisca Lopes Anselmo, Carlos Bambini, Henorá Gasparoto Buim, seu marido Wanderley Buim, Marilena Mendonça, - que me revelou ser minha prima -, nestes professores da primeira hora quero estender minha gratidão a todos os inumeráveis professores com os quais convivi por trinta anos, pelas magníficas lições de companheirismo, fraternidade e profissionalismo que me deram, e das quais nunca me esquecerei.
            Minha comovida gratidão ao senhor Arnaldo Coneglian, farmacêutico, por cujas mãos me foram abertas as portas  da Faculdade de Ciências e Letras de Jandaia do Sul, onde me matriculei e me licenciei em Língua Portuguesa e Francesa. Com efeito, apesar de bacharel em Filosofia Pura, licenciado em Teologia Dogmática, Sagrada Escritura e Direito Canônico, pela Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, de São Paulo, seus graus acadêmicos não me davam o direito de lecionar em escolas públicas. Foi a licenciatura em Letras na Faculdade de Jandaia do Sul que me permitiu por concurso de provas e títulos o ingresso no Quadro Próprio do Magistério do Paraná.
            E aos meus inumeráveis ex-alunos, esparramados por esse Brasil  inteiro, muitos deles doutores, políticos, professores, empresários bem sucedidos, profissionais competentes, pais e mães de família comprometidos com a educação de seus filhos, ex-alunos com quem aprendi os segredos da Língua Portuguesa, muito mais do que eles aprenderam  comigo? A eles, também, a minha mais efusiva gratidão por terem sabido suportar por tanto tempo a casmurrice, o autoritarismo e o constante mau humor do sofrido professor, e os considero como os mais sinceros e cordiais amigos que encontrei na vida e que, bem ou mal, coloquei minha modesta pedra na construção de tantas e variadas personalidades.
            No meu primeiro ano de estada na cidade, por vários motivos o mais sofrido de quantos já passei, uma pessoa foi o bálsamo que minorou as feridas de minha alma. Essa pessoa foi e é minha esposa Cleusa, a dona Cida para os amigos de Barbosa Ferraz. Quero de público manifestar a ela o meu amor e gratidão, tanto mais porque ela me deu a preciosa dádiva de quatro filhos maravilhosos e, através deles, um batalhão de netos e netas, que hoje são a alegria e o lazer de meus poucos e embranquecidos cabelos.
            E Barbosa Ferraz? Quero confessar que desde o primeiro instante em que pisei neste solo, já tomei a cidade como minha pátria de adoção. Por isso, ao terminar, peço-vos licença para reproduzir o final de um poema  que compus tempos atrás em homenagem a Barbosa Ferraz, e que poderia muito bem ser o fecho desta dívida de gratidão e de meu futuro e eventual testamento:

                                              Cidade -menina  hospitaleira de Barbosa Ferraz
                                               Escuta meus rogos que agora te faço
                                               Depois que eu morrer
                                               Que não seja meu corpo
                                               Em terras estranhas ao túmulo dado
                                               Mas que ele contente
                                               De júbilo tomado
                                               No sono da morte repouse em teu seio



    Curitiba, setembro de 2016
    Aroldo Teixeira de Almeida

                                     ***************************************************

                                     


           
           
           
        

sábado, 3 de setembro de 2016

A MINHA ORAÇÃO DA MANHÃ DE HOJE


         
            Que meus olhos se abram e eu comece, com urgência, a superar meu próprio egoísmo, sair de mim mesmo e dedicar-me, de vez, à custa de quaisquer sacrifícios, à luta não-violenta por um mundo, ao meu redor, mais justo e mais humano!
            Que eu não deixe para amanhã, mas comece hoje, agora, sem entusiasmos passageiros, mas  com decisão, firmeza e pertinácia, a realizar tudo o que preciso fazer neste dia, e que a "Providência de Deus" exigir de minha pobre vida.
             Que eu olhe em volta de mim para descobrir irmãos e irmãs, marcados pela mesma vocação de dizer adeus ao comodismo, e de marcar encontro  com todos os que lutam pela  Verdade e juraram dedicar a vida tentando abrir, através da Justiça e do Amor, caminhos para a paz e a compreensão entre todos com quem convivo.
            Que eu não perca tempo em discutir lideranças e privilégios entre os grupos comunitários de que participo; o importante é  unir-nos sempre mais e caminharmos, firmes, para o nosso objetivo, através da Justiça e do Amor, lembrados de que o tempo corre célere contra nós!
            Que eu dê o melhor de mim mesmo à sagrada missão, através da qual espero que a pressão   libertadora se tornará capaz de atingir as indispensáveis mudanças de comportamento das estruturas sociais, econômicas e políticas, dentro das quais eu vivo.
            Que eu faça, diariamente, a prece de Francisco de Assis, e que esta prece me relembre  sempre o ideal que devo perseguir em todos os dias de minha vida:

                                         Senhor, fazei de mim um instrumento de Vossa paz
                                         Para onde há ódio, que eu leve o Amor
                                         Para  onde há ofensa, que eu leve o Perdão
                                         Para onde há discórdia, que eu leve a Paz

                                         Para onde há erro, que eu leve a Verdade
                                         Para onde há dúvida, que eu leve a Fé
                                         Para onde há desespero, que eu leve a Esperança
                                         Para onde há trevas, que eu leve a Luz
                                         Para onde há tristeza, que eu leve a Alegria

                                         Ó Mestre, possa eu preferir
                                          Consolar, do  que  ser consolado
                                          Compreender, do que ser compreendido
                                          Amar, do que ser amado
                                         
                                          Porque:
                                          É dando,  que  se recebe
                                          É no auto-esquecimento, que se pode encontrar
                                          É perdoando, que se é perdoado
                                          É morrendo, que se ressuscita para a Vida Eterna!

                                                          **********************
                                                            



           



domingo, 28 de agosto de 2016

A Graça, presença de Deus em nós

            Li em algum lugar, não me lembro onde, - por isso a  passo à frente pelo preço que me custou -  a estória de um homem (não seria eu?) que julgava poder tudo neste nosso mundo. Aliás, era assim que o apelidavam, os que simplesmente o conheciam bem:  "o homem-que-podia-tudo".
            Certo dia, veio-lhe à mente a percepção de que, mesmo sentado na sua poltrona favorita, não estava absolutamente parado: como aprendera na escola, ele e o mundo estavam girando a uma velocidade de 1.700 km horários, pois esta é a velocidade da Terra ao redor de seu próprio eixo. Pensando nisso, aborreceu-se deste planeta que o arrastava irresistivelmente consigo.
            Como  era "o homem-que-podia-tudo", decidiu transferir-se para fora de nosso sistema solar. Demandou outras paragens cósmicas. E foi tão longe e tão tranquilo que pouco lhe importava saber em que sistema se situava. Pelo menos estava fora das frenéticas velocidades do sistema solar.
             Topou, por acaso, com um dado que lhe roubou totalmente a tranquilidade encontrada. Estava, efetivamente, girando a uma velocidade louca: 2.172.000  km horários, acompanhando a nossa galáxia numa viagem em torno do centro de um conglomerado de 2.500 galáxias vizinhas.
              O "homem-que-podia-tudo", de repente, intuiu que não podia mais. Era levado por algo maior que o envolvia. Buscar a tranquilidade significava perdê-la.
              Renunciou ao seu nome e a suas pretensões. Regressou humildemente à sua Terra e, uma vez na Terra, à sua casa. Sentou-se tranquilamente na sua poltrona favorita e aprendeu a contemplar a tranquilidade de todas as coisas que, apesar de todas as velocidades a que estavam acometidas, não se alvoroçavam nem se enfureciam. Estavam sempre como que paradas na serena tranquilidade e na tranquila serenidade de uma natureza morta. Acolher a fuga era encontrar a tranquilidade. Era encontrar a graça de todas as coisas.
                                                       
                                                            ***********************

            Terminada a leitura da estranha estória, veio-me à mente algo que me deixou um tanto quanto admirado: era domingo, eu fora à Missa e o celebrante em sua homilia falara da Graça de Deus. Não seria  a Graça algo parecido com o que sentira aquele homem?  Ela tudo penetra, tudo envolve. Acolhê-la é agraciar-se; fugir é prejudicar-se sem conseguir apartar-se de Sua presença. Ela não se modifica na Sua gratuidade. Só homem e mulher se modificam; só eles se modificam; só eles podem ser graça e desgraça. A Graça, porém, é só Graça. E, pela misericórdia de Deus, de graça!

                                                           ************************

Aroldo Teixeira de Almeida, oitenta anos bem vividos, é bacharel em Teologia Dogmática pela Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, da Capital paulista, e professor aposentado de Língua Portuguesa e Francesa.


             

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

A SALVAÇÃO COMO DADO OBJETIVO


            É conhecida a anedota daqueles que devem escrever uma dissertação sobre o camelo. O alemão, dizem as más línguas, distingue o camelo "objetivo" e o camelo "subjetivo". Não sou alemão, mas neste meu blog de hoje vou retomar essa divisão.
            Do ponto de vista objetivo, homem e mulher são distinguidos por três aspectos da "salvação":
a justiça, a vida e o amor, e, enfim, a consciência da responsabilidade, que pode determinar até mesmo o sentimento da culpabilidade.
            Do ponto de vista objetivo, homem e mulher são abrangidos por três aspectos da "salvação":
a Justiça, a Vida e o Amor e, enfim, a consciência da "Responsabilidade", que  pode determinar até mesmo o sentimento de "Culpabilidade
            Do ponto de vista subjetivo, a noção de salvação, tal como eu a vejo, ao tentar deslindar  meu tão vasto problema, implica num dom que somente Deus pode conceder. É uma Graça, um apelo a que homem e mulher respondem; a resposta se faz na Graça, por ela e com ela. Mas, para homem e mulher modernos, qualquer aceitação me parece problemática, pois ambos  são "seres que se devem fazer", que devem agir, transformar o mundo "criando valores".

            JUSTIÇA

            Antes de tudo, a salvação é Justiça. Dentre três homens e mulheres, dois não dispõem do mínimo necessário à vida, neste nosso mundo. Muitos cristãos me parecem ter a impressão de que Deus é 'ineficaz'. A salvação realiza a Justiça terrestre. É verdade que o Reino de Deus, como aprendi na Teologia, não é deste mundo, mas ele  deve "começar neste mundo".
            Todos os que levaram a sério a Graça e o Amor de Deus  e dos homens e mulheres realizaram na Terra um começo desta Justiça, que é um dos atributos de Deus na Bíblia Sagrada.
             Lendo a vida dos santos, descobri que São Vicente de Paulo, São João Bosco, Santa Catarina de Gênova, encontraram soluções onde homem e mulher haviam desanimados. Representam eles a Esperança concretamente vivida. Mas, ao que me parece, esta Justiça realizada pelos santos, por lhe faltar institucionalização, não  conseguiu fazer nada, uma onda alta que transformasse as estruturas econômicas e sociais, políticas e culturais de uma sociedade.
             A Igreja deseja que o laicato anime cristãmente as estruturas temporais. Importa que os cristãos, de preferência leigos, participem desta missão , para tornarem conhecida a doutrina cristã, porque  acreditam ser ela mais verdadeira, mais capacitada para integrar um certo número de valores no plano humano.
             Os católicos e os demais cristãos vêm atualmente empenhando um belo esforço nesta linha. Não digo que logo se devam mudar as estruturas antes de se anunciar o Evangelho - cumpre fazer "as duas coisas conjuntamente".
             Cumpre fazer "as duas coisas conjuntamente".

                                              **********************************