"Nosso tempo é um tempo de esperança", proclamava tempos atrás a declaração final do Congresso pela Paz e a Civilização Cristã, reunido em Florença, Itália. Para o compreender, é preciso decifrar o sentido dos acontecimentos. Nós, que nos identificamos como cristãos, necessitamos convencer-nos da ambiguidade de todas as situações históricas concretas nas quais devemos encarnar a nossa esperança teologal.
Muitos filósofos e teólogos, mergulhados nas suas reflexões e pesquisas, ocupam-se dos fins transcendentes de homem e de mulher numa outra vida, a eterna, de tal maneira que praticamente não concedem nenhuma atenção às preocupações materiais que nos oprimem. Parecem esquecer das esperanças terrenas que possuímos neste nosso mundo.
Procuram-se incessantemente as verdades eternas, mas passa-se ao lado daquelas que se refletem no movimento concreto e quotidiano da História. Eis porque me parece residir aqui a grande distância entre o pensador e filósofo católico e o homem e mulher comuns, no dia a dia. Passam-se as coisas como se o pensador cristão receasse intrometer-se nas coisas terrenas que afetam a vida da comunidade concreta.
Parecem esquecer que também para nós, seres comuns, existe uma esperança neste mundo...Em todo caso, ainda encontramos pensadores cristãos que se preocupam com os prosaicos problemas que atormentam a vida de homens e mulheres na sua vida diária.
Um desses pensadores, católico, Charles Tresmontant, em seu livro "Ensaio sobre o Pensamento Hebraico", traz palavras candentes sobre o tema. Diz ele:
- "O sofrimento e a derrota são a intervenção de Deus, para que homem e mulher não se instalem numa condição de passividade e alheamento diante dos problemas do mundo. Cada vez que a cristandade deixa perder ou negligencia uma partícula da missão de que é depositária e que tem o encargo de fazer frutificar, um adversário se levanta e a ataca em nome dessa partícula da missão que ela, a cristandade, deveria cuidar. Se a cristandade nada mais anuncia aos pobres, outros anunciarão aos pobres a justiça; mas em troca investirão contra a cristandade para a despedaçar, como outrora o assírio e o egípcio atacavam Israel e o devastavam quando ele se mostrava infiel aos desígnios de seu Deus."
Creio que, mais do que outra coisa, nós que nos dizemos cristãos devemos tomar como nosso dever a preocupação com a esperança terrestre do homem e da mulher, porque a esperança humana não é separada, e sim distinta da esperança teologal numa vida eterna, como nos ensina a religião.
Para quantos milhões de seres humanos nosso Cristianismo nada mais é que uma religião exclusivamente ocupada com a salvação da alma, esquecendo que somos também corpo? Ou quando nossa prática cristã não passa de uma obsessão pelo pecado, um medo de tudo o que é terreno?
É claro que todos nós, seguidores de Jesus de Nazaré, levamos nossa vida amparada pela esperança da terra prometida por Ele.
Mas é preciso não esquecer que essa terra prometida tem seus inícios nesta terra nossa de todos os dias. Deus confiou-nos uma tarefa que não se cumprirá sem nós. Confiou ao homem e à mulher, no coração do universo, o cumprimento de uma "jornada de trabalho" sobre a Terra, aquilo a que São Gregório chamava de "jornada cósmica", e esta obra não se cumprirá sem nós.
Sempre gosto de refletir nesta frase carregada de esperança: somos co-criadores com Deus.
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