sábado, 4 de fevereiro de 2012

A AMIZADE NA PERSPECTIVA DO AMOR

                      (Dedicado aos amigos e amigas que têm prestigiado o Blog do Mestre)


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     Desde que surgiram os primeiros rudimentos de escrita, há documentos antiquíssimos comprovando que o tema da Amizade já fazia parte das preocupações da época. No decorrer dos séculos a Amizade   foi-se tornando o grande sonho, a grande aspiração das almas generosas, o tema predileto de prosadores e poetas de todas as tendências. E nossa literatura, a portuguesa e a brasileira, é celeiro abundante das mais variadas manifestações e arroubos literários diante de tema tão fascinante.
      Aliás, é próprio do ser humano procurar o convívio sadio com os seus semelhantes. Jamais homem e mulher poderão viver e subsistir desligados física e espiritualmente um do outro. Todos precisam amar e ser amados. Seria um defeituoso psiquicamente quem não encontrasse na vida uma manifestação de afeto que lhe inundasse o coração. E o coração é insaciável, diz-nos a experiência do dia a dia. Só a Amizade de um Amigo poderá verdadeiramente saciá-lo.
      Quando não encontram esse Amigo, homem e mulher tornam-se autênticos órfãos, como já testemunharam os antigos. Seria terrível orfandade não haver, nas horas tormentosas da vida, uma alma que nos compreendesse, uma mão amiga que se estendesse para nós, uma alma gêmea que nos penetrasse o íntimo da alma, escutasse nossos desabafos, nos confortasse com uma palavra de fé e coragem. O escritor Paulo Ximenes, escrevendo sobre o assunto, assevera que "a profundeza e a largura de uma amizade se conhecem nas dificuldades e nos sofrimentos."  Uma visita reconfortante, algumas palavras amigas, uma boa notícia, um bilhete carinhoso que seja, muitas vezes é o suficiente para restituir-nos a alegria e o entusiasmo de viver, quando tudo parecia desmoronar a nossos pés.
      - "Basta a sombra de um Amigo para tornar o homem feliz!" -  observava o poeta grego Menandro. E este Amigo foi definido por alguém como sendo aquele que primeiro entra em nossa casa quando o mundo inteiro nos abandonava. Aquele que sempre está disposto a sacrificar-se pelo outro, que instintivamente acorre em auxílio do outro, sem que seja necessário pedir-lhe.
      Neste ponto lembro-me de um belo pensamento de Allan Petermann, que diz assim: - "Amigos não são aqueles que nos enxugam as lágrimas, e sim aqueles que não as deixam cair."
      O escritor Doug Larsen coloca uma pitada de ironia no seu pensamento: - "Um amigo de verdade é aquele que te apóia nos fracassos e tolera o teu sucesso..."
      Ou como diria Juan Arolas: - "Quem não possui um amigo, para confiar-lhe ventura e males, é um estrangeiro em toda parte."
      O pessimista de plantão logo aparece com a sua interrogação ferina: existem ainda desse Amigos verdadeiros, em quem deveras se pode confiar?
      A objeção possui a sua razão de ser. Tem-se dado o nome de Amigo a tanta coisa, que é quase impossível distinguir o falso do verdadeiro Amigo.
      Há uma infinidade de "amigos". Amigo-camarada, amigo-de-trabalho, amigo-de-balcão-de-bar, amigo-interesseiro, e por aí vai. Se existe até o amigo-da-onça...
      São amigos para nos prestarem esporadicamente algum favor, para trocar idéias, para jogar palavras fora numa mesa de café ou num banco de jardim, para discutir política ou futebol, para falar de mulher. Tratando-se de mulheres, para falarem mal dos maridos, comentarem o último capítulo da novela, ou fofocarem sobre outras "amigas"... Apesar disto, estamos fartos de ouvir a quase todo instante: meu inesquecível amigo, meu caro amigo, meu prezado amigo, meu amigo do peito; - mas na verdade, encontrar-se um verdadeiro Amigo, que nos cative de vez o coração, não é muito fácil nos tempos que correm.
      Com a agitação da vida moderna, com a correria das grandes cidades, com a superlotação dos ônibus, com a acirrada competição por um emprego melhor, para a realização de negócios, não há quase mais tempo para o cultivo da Amizade. O que se nota, em grande parte, é a amizade interesseira, a amizade fingida por conveniência. Não há Amigos. Há, e muitos, amigos. Como já se disse, amigos de ocasião. Amigos que enganam a todos, sempre que podem, com palavras amáveis e generosas.
      Cuidemos, porque amigos há também, e numerosíssimos, que apenas consagram amizade a pessoas bem instaladas na vida, a políticos influentes, a empresários poderosos, a funcionários venais e corruptos. Amigos do dinheiro. Amigos de banqueiros. Amigos de recepções. Amigos para troca de influências. As cidades estão cheias deles. Basta ler os jornais.
      Vem, a propósito, a frase singela do hoje não mais lido e esquecido romancista português, Camilo Castelo Branco, em seu romance "Amor de Perdição": - "É nas coisas mais insignificantes que se avalia um amigo verdadeiro."
      - "Vive a Amizade, se ferve a panela!" - diz a sabedoria popular. Um só golpe de má sorte é suficiente para que todos esses "amigos" desapareçam. Nem cumprimentem mais aqueles a quem antes até se tornavam enfadonhos, pelo ridículo da bajulação. Como disse São Jerônimo, nos primeiros séculos do Cristianismo: - "A amizade que pode acabar nunca foi verdadeira amizade." De verdadeiros Amigos é que há grande falta. E falta tão grande, que um influente escritor bastante conhecido chegou a dizer:
      - "Todos, que neste mundo cheio de ódio e violência, encontrarem um Amigo - alma pura, cheia de calor, de amizade e de espírito de sacrifício e doação - ajoelhem e deem graças a Deus, porque encontraram com certeza o maior bem da Terra."
      Também Ivo dos Santos Castro, na Folhinha Vozes, dá a sua colaboração para esta página: - "O bem que não se conseguir com a amizade, muito menos se conseguirá sem ela."
      Se todos, homens e mulheres, se preocupassem um pouco mais com a felicidade daqueles que os cercam, se considerassem todos os seus semelhantes como membros de sua imensa família espiritual, então a vida na Terra seria mais bela. Lembro-me muito bem ainda, após tantos anos, das palavras de meu companheiro de estudos na Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, na capital paulista, Luiz Cechinato: - "Se você quer ter amigos, deve ganhá-los através do amor, da simpatia e da sinceridade."
      Só o culto da Amizade sincera e desinteressada - praticado com dignidade e espiritualismo - terá força bastante para atrair sobre o mundo o equilíbrio e a paz, de que ele tanto precisa. E a Amizade, assim compreendida, como bem disse George Brassens, - "nada pede em troca, apenas uma pequena manutenção."
      Só a Amizade, e somente ela, quando se transfigurar em Caridade, poderá trazer a semente de uma nova sociedade, mais justa, mais digna, mais duradoura, mais cristã.
      E a medida dessa Amizade agora transfigurada em Caridade, a mais nobre das virtudes, conforme o apóstolo Paulo, é o "amai-vos uns aos outros como eu vos amei!"

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