terça-feira, 15 de maio de 2012

REFLEXÕES À BEIRA DO FOGO


        "Venha a nós o Vosso reino", rezamos diariamente no "Pai Nosso". Esta vinda a nós do Reino de Deus é o que denominamos Parusia, a segunda vinda de Jesus de Nazaré até nós. Entretanto, a  Parusia permanece como o grande problema do Cristianismo. Em si, evidentemente, não se trata de um problema real, porque o Reino de Deus já está estabelecido, não, porém, definitivamente manifestado. Continua  ainda  num tempo de desenvolvimento, de opção livre e de preparação.
      Permanecemos todos num tempo de decisão. O cristão é alguém que "se decidiu" pela Parusia. Pela vinda, no fim dos tempos, do Reino de Deus. Toda a vida do cristão é orientada por esta decisão fundamental. Sua existência tem sentido na medida em que a segunda vinda de Cristo é, para ele, de importância absoluta na vivência de todo dia.
      No entanto, a Parusia, esta segunda vinda de Jesus de Nazaré, nos parece, acha-se indefinidamente adiada, pelas próprias palavras dos Evangelhos.
      Também isto não é um acaso. Deve ser aceito como fazendo parte do problema. Considerada em si mesma, a Parusia não é problema. A demora da Parusia não é todo o problema. Essa demora é que faz surgir o problema. Penso que uma possível solução para tal problema seria o seguinte:
      Como cristãos, somos homens e mulheres que colocam todas as suas esperanças pela vitória final quando da segunda vinda de Cristo - e esta vitória seria a vitória final e definitiva da vida sobre a morte.
      Tendo a Parusia sido "adiada", foi-nos deixada, nestes mais de dois mil anos, a tarefa de construir para nós e nossos filhos, neste mundo, uma espécie de reino, uma cristandade cultural, política  e religiosa que, temos de admitir, não é tudo o que se esperava, mas que tem lá suas vantagens.
      Ora, a questão insidiosa é esta: se a vinda de Cristo significa o fim e a destruição dessa estrutura provisória por nós criada, e principalmente o seu julgamento por Cristo, devemos sinceramente desejar a Parusia? Não deveríamos então, seguramente, rezar para que a Parusia seja adiada indefinidamente?
      Se, com todo o poder que nos foi dado  de mover a vontade de Deus pela nossa oração, não deveríamos nós, antes, tentar mudar os planos de Deus, e não nos preocuparmos mais com o problema de sua vinda até nós, para o julgamento final?
      Não deveríamos considerar nosso dever pedir a Deus que Ele nos permita construir o Reino a nosso modo, um Reino consistente com o que já iniciamos neste mundo?  Um Reino de Deus ao mesmo tempo sagrado mas encravado no mundo, e ao mesmo tempo colaborando também no terreno social e político com o mundo? 
      Não deveríamos insistir em que a Parusia fosse considerada como nosso triunfo social, cultural, religioso e político no mundo e, assim, não mais sermos um obstáculo, pois já conseguimos estender nosso domínio sobre o mundo inteiro?
      O certo é que já tentamos isto uma vez, diz-nos a História. Foi no século VIII e atravessou toda a Idade Média. Foi uma boa tentativa de nossos antepassados, mas alguns pontos importantes foram descuidados, e a tarefa fracassou. Não seria possível  assumirmos um compromisso que nos permitisse uma nova tentativa, para sermos desta vez mais bem sucedidos?
      Assim pensando, estaríamos na realidade decidindo-nos contra a segunda vinda de Cristo, contra a Parusia. Continuaríamos a rezar: "Venha a nós o Vosso Reino." - não, porém, agora. E nem na maneira desoladora de um julgamento. Se ele tiver que vir, que venha, mas da maneira que nos convier.
      Com isso, nós cristãos aprendemos a orar contra a vinda do juízo final, e por uma eternidade que seria um prolongamento indefinido do tempo. Pois nós precisamos de tempo. De muito tempo. Tempo para tentarmos construir o que até agora julgamos incompleto, e precisamos de tempo para completá-lo.
      Minha sugestão para uma correção no "Pai Nosso", a oração que Jesus nos ensinou: em lugar de: "Venha a nós o Vosso Reino", eliminemos essa frase e a substituímos por esta outra, mais conveniente às nossas necessidades: "Dai-nos tempo, Senhor!"...
     E então, que faríamos com esse "tempo" que nos seria dado? Faríamos deduções na História negativa do passado? Inventaríamos um novo sistema cristão, - e dessa vez o faríamos funcionar? Ou antes, observaríamos  cuidadosamente os sistemas inventados por outros, e batizaremos seus sistemas, tornando-os repentinamente cristãos, e neles descobrindo o inesperado Reino?
      Deixo aqui a minha sugestão, na forma de tais questionamentos...
     

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