quarta-feira, 16 de maio de 2012

O SONHO DE BARTH

      Lendo a biografia de Karl Barth, líder da teologia e da exegese protestante, descobri que ele certa noite sonhou com Mozart. Achei um tanto quanto estranho, porque Barth sempre se sentiu melindrado pelo catolicismo de Mozart, e pelo fato dele rejeitar publicamente o protestantismo. Aliás, foi Mozart que disse: " O protestantismo está todo, e tão só, na cabeça." E ainda: "Os protestantes não conhecem o sentido do Agnus Dei qui tollis peccata mundi, e apesar de seu biblicismo e da sua bibliolatria, se esquecem de que estas palavras também estão na Bíblia, e são elas de igual modo palavra de Deus: - Todas as gerações, de agora em diante, me chamarão de bem-aventurada."
       No sonho, Barth foi indicado para examinar Mozart em conhecimentos teológicos. Desejava tornar o trabalho de examinador tão favorável quanto possível. Assim, em suas perguntas, fazia questão de aludir expressamente às "Missas" do compositor. Mozart, porém, no sonho, não respondia nada ao interrogador.
      Este trecho de sua biografia me deixou comovido pela sinceridade de Barth. O sonho tem a ver com sua salvação e Barth está se esforçando por admitir que ele será salvo mais pelo Mozart que está nele, do que por sua própria teologia.
      Cada dia, durante anos Barth, também ótimo musicista, tocava Mozart todas as manhã, antes de iniciar seus trabalhos teológicos. Creio que ele procurava, talvez inconscientemente, despertar o Mozart nele oculto, a sabedoria interna que se harmoniza com a música divina e é salva pelo amor. Enquanto o outro ser, o seu ser teológico, que deveria se preocupar mais com o amor vivo e atuante, na realidade abraçava um amor muito mais severo, mais cerebral e abstrato. Um amor que, afinal, não está em seu próprio coração, mas somente em Deus, e é revelado apenas à nossa cabeça, não ao nosso coração.
      Como disse linhas acima, a sinceridade de Barth, na sua biografia, é muito comovente, e deve ser compreendida e respeitada.
      Barth diz também, com muito sentido, que é "uma criança, mesmo uma criança divina, que nos fala na música de Mozart."
      Algumas pessoas, declara ele, sempre consideraram Mozart uma criança em relação às coisas práticas da vida. Ao mesmo tempo, afirma que ao menino-prodígio Mozart nunca foi permitido ser criança no sentido literal da palavra. Tinha apenas seis anos quando deu seu primeiro concerto público .Contudo, foi sempre uma criança "no sentido mais elevado do termo."
      Encerro meu texto dizendo a Karl Barth que, tenho certeza, ele está na Casa do Pai:  Nada temas, Karl Barth! Sempre confiaste na misericórdia divina. Sei bem que cresceste e te tornaste um teólogo de credibilidade mundial, e Cristo permanece em ti uma criança. Teus livros e tua teologia valem muito mais do que poderías pensar! Lembra-te que em todos nós há um Mozart divino que será a tua e a nossa salvação.
     
     

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