segunda-feira, 8 de setembro de 2014

GESTOS QUE DESPERTAM



            Há gestos que despertam, que levam a refletir, que marcam.
            Anos atrás, quando uma vez, saí de madrugada da casa de parentes em São Paulo, para tomar o ônibus de volta a Curitiba, guardo até hoje a imagem de minha avó, septuagenária, de braço erguido, segurando um candeeiro para iluminar o mais possível meus passos até a rua...
            Há gestos assim que valem como um programa de vida: erguer um candeeiro, afastar as trevas, difundir a luz, mostrar o caminho...
            E, também, muito belo o gesto de acender um lampião, ou uma vela, ou simplesmente acender o fogo humilde que vai cozinhar os alimentos.
            O gesto de regar plantas é também muito expressivo. Acho muito necessário difundir este gesto e lembrar aos nossos amigos, e de modo especial aos esposos e aos noivos, que o Amor é plantinha frágil que precisa ser regada continuamente!
            Subir e descer! Dois gestos que sempre me ajudam a refletir... Subir, sem entontecer, sem julgar-se maior que os outros, nem melhor do que ninguém... Descer, recordando a grande Descida, a vinda do Filho de Deus ao mundo para tornar-se Homem, nosso Irmão...
            Descer, de coração alegre e leve, para ficar mais perto dos Pequenos, dos Humildes, dos que sofrem...
            Peço vênia para continuar citando gestos que me parecem muito expressivos:
            Despertar de manhã cedo, abrir os olhos, vê-los enchendo-se de luz de um novo dia que se inicia, lembrança viva do Início da Criação...
            Adormecer, dormir, perder contato com a vida consciente, mergulhar no torpor: lembrança perfeita da morte, meditação oportuna sobre o grande sono do qual despertaremos no grande dia da Ressurreição...
            Para que gesto mais expressivo do que caminhar? é, para mim, um ideal de vida: progredir na compreensão, caminhar na Fé, na Esperança, no Amor!
            Abraçar também é um gesto lindo. É o contrário de separar. Abraçar é unir. E me faz lembrar que há tanto desencontro, desunião entre esposos, entre pais e filhos, entre irmãos, entre vizinhos, entre patrões e operários, entre países, entre continentes...
            Ler: mas não só letras, sílabas, palavras e frases. Ler a Natureza. Saber entendê-la. Saber interpretá-la. Descobrir o Criador por detrás das Criaturas.
           Voar foi sempre um sonho para o homem. Sonho hoje em plena realização. O homem já não se contenta de voar de cidade a cidade, de país a país, de continente a continente: partiu para a Lua, desceu em planetas, e sonha ainda chegar às profundezas do Universo...
           Quando se começa a descobrir o simbolismo de cada atitude e de cada gesto, nota-se que o Universo inteiro vira um grande Sacramento, no sentido de algo visível, de tangível, de audível, que nos leva ao Criador e Pai de todos os pais.
           Que gesto não tem uma quinta dimensão? Que gesto não é capaz de levar-nos além do espaço e do tempo, e de chegar até Deus, e mergulhar-nos na Eternidade?...
 
                                                        ***************

Mergulhemos na poesia inspirada de Camões, o príncipe dos poetas da Língua Portuguesa:


                                                   Onde acharei lugar tão apartado
                                                   E tão isento em tudo da ventura,
                                                   Que, não digo eu de humana criatura,
                                                   Mas nem de feras seja frequentado?

                                                                       Algum bosque medonho e carregado,
                                                                       Ou selva solitária, triste e escura,
                                                                       Sem fonte clara ou plácida verdura,
                                                                       Enfim, lugar conforme a meu cuidado?

                                                  Porque ali, nas entranhas dos penedos,
                                                  Em vida morto, sepultado em vida,
                                                 Me queixe copiosa e livremente;

                                                                       Que, pois a minha pena é sem medida,
                                                                       Ali triste serei em dias ledos,
                                                                       E dias tristes me farão contente.

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Aroldo Teixeira de Almeida é professor aposentado do Quadro Próprio do Magistério Paranaense, e bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, SP.
 
 

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