Do poeta tcheco de minha predileção, Rainer Maria Rilke:
Quiconque pleure à présent quelque part dans le monde,
sans raison pleure dans le monde,
pleure sur moi.
Quiconque rit à présent quelque part dans la nuit,
sans raison rit dans la nuit,
rit de moi.
Quiconque marche à présent quelque pars dans le monde,
sans raison marche dans le monde,
vient vers moi.
Quiconque meurt à présent quelque pars dans le monde,
sans raison meurt dans le monde,
me regarde...
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As solenidades em comemoração da presença de Cristo entre nós, na Eucaristia, levam-me a falar da Caridade, pois essa presença de Cristo, sob as espécies do pão e do vinho consagradas pelo sacerdote durante a Santa Missa, é a maior prova de Seu amor para conosco, pobres pecadores, mas a caminho do Reino.
Abrindo este blog de hoje, no qual tenho a ousadia de dar um testemunho da Caridade, da mais alta virtude que vem de Deus, a primeira sensação que me assaltou foi a de uma terrível indecisão, de incompetência: mas logo a seguir tive a alegria de descobrir que esse é o mais fácil e tranquilo dos testemunhos, porque a mais alta virtude é justamente aquela que desce mais baixo e alcança sempre, a Você, benévolo leitor, e a mim, humilde escrevinhador.
A Caridade está em toda a parte. Nós a encontramos em todos os lugares e em todas as horas. Ela é paciente; suporta o mundo sem Fé; corre atrás do mundo sem Esperança. Persiste, aguenta, esconde-se para servir e mostra-se para ajudar. Está aqui, está ali, não se cansa, não se irrita nunca.
O mundo é um abismo de Caridade; é um vale de lágrimas, das lágrimas da Caridade.
A Caridade está em toda a parte. Onde houver face de homem ou de mulher, onde se ouvir uma palavra, apesar das feridas das paixões e dos acentos estridentes da mentira, há alguma coisa que se mete de permeio, que insiste e insiste, sempre, sem se cansar.
Eu a vejo nas ruas de meu bairro, nas faces convencionais e tristes dos gestos travados, nos sorrisos amordaçados, no olhar que se desvia, na palavra que se engole, para não ferir. Eu a vejo nos lugares barulhentos das praças e nas circunstâncias mais banais. Uma velha desconhecida que tropeça e cai na minha frente, e me olha espantada de ter caído; um mendigo sentado na calçada, me olhando, triste, esperando o dom de alguns trocados.
Tudo me fala dessa presença absurda, mas que me convida e me incita a uma imensa e total reconciliação com o meu semelhante que sofre.
A Caridade é boa. O mundo pode perder a Fé e a Esperança, mas não perde a Caridade, porque a Caridade não perde o mundo. Não o deixa, não deixa vazio qualquer recanto, é como uma dona de casa que anda solícita e cuida de todos os vãos, arrumando, varrendo, adornando com flores e com carinho.
Onde gente pretensamente culta discute com pedantismo literário os males do mundo, pelo prazer de ouvir o som da própria voz, a Caridade vem e se põe no meio; basta acontecer alguma coisa, um desentendimento qualquer, para que um braço se estenda, a mão se abra e uma palavra boa se faça ouvir.
A Caridade está alastrada no mundo. Se for pisada aqui, ela renasce acolá. É impossível evitar sua perseguição tenaz e branda. Se as portas de minha casa permanecem fechadas por medo de eventuais ladrões, ela entra pelas frestas como uma brisa ligeira, instala-se num canto da sala - criada humilde pronta para servir, mãe amorosa atenta para amparar.
A Caridade fica quieta; espera; é paciente; é boa. Sabe que mais cedo ou mais tarde terá feridas para curar. Quando é enxotada, ela sempre volta. Quando é insultada, ela perdoa.
Às vezes arrastam seu santo nome, por derrisão, nos lugares onde o pobre e o faminto são escarnecidos pela filantropia vazia e sem amor; nem assim, diante da usurpação e do ridículo, ela volta atrás. Está ali sempre, ali fica. Até mesmo nas próprias instituições ditas de caridade, a Caridade aguenta permanecer.
Sua ironia é assim, ironia de mãe, que cuida de tudo, entrega-se a tudo, sem nada querer em troca. A não ser fazer presente a força do Amor.
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Aroldo Teixeira de Almeida, bacharel em Teologia Sistemática, é professor aposentado de Língua Portuguesa e Francesa, do Quadro Próprio do Magistério Paranaense.
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