Estava eu lendo um livro de aventuras escrito pelo autor alemão Karl May, e daí surge uma ação desastrada de seu ainda mais desastrado personagem, Halef, diminuto servo do herói do romance. Contagiado pelo inaudito da situação, me pus a rir ruidosamente e, tanto, que escandalizei minha mulher que "trabalhava", na cozinha.
Algum tempo depois, lembrando do acontecido, desculpei a mim mesmo, com a intuição de que o mundo seria muito melhor se todos tivéssemos o belo costume de sorrir, e sorrir sempre, mesmo nos momentos mais solenes.
E por que sorrir? Porque sorrir é ato muito importante, dependendo sempre da profundidade e da origem do sorriso.
Lembrei-me de tempos passados, quando minha esposa e eu esperávamos, ansiosos, o primeiro sorriso do nosso primeiro filho, hoje, tão sorumbático e sério...
Você, que perde seu tempo lendo este texto, já se deu conta de que sorrir é ação própria do homem?... Nem o macaco, que dizem ser muito próximo de nós, homem e mulher, sorri... O cachorrinho de minha neta Isabela manifesta sua alegria a ela, sorrindo e, é claro, à sua maneira canina, balançando a cauda...
Escrevi linhas acima que sorrir é próprio do homem. E escrevi também que é importante medir a profundidade e a origem do sorriso. Não merece o nome de sorriso o entreabrir artificial dos lábios, só para ser amável com os fregueses ou com visitas de cerimônia, ou com amigos convencionais...
Não merece o nome de sorriso o entreabrir de lábios que costuma acompanhar a ironia, gozando a perversidade que deve ter atingido o alvo, gozando a malícia que deve ter feito alguém sofrer...
Sorriso, sorriso mesmo, como eu o entendo, vem de dentro. Do fundo da alma. Traduz alegria, compreensão, amor e paz.
Nos meus idos tempos de professor de Português, em Barbosa Ferraz, cidadezinha maneira no interior do Paraná, eu dizia aos meus alunos que o sorriso, o riso e a risada ruidosa são sinônimos. São irmãos.
Há distinções, é evidente. O riso é mais aberto, mais ruidoso, lembrando festa. Quando meu time do coração, o Jabaquara, metia um belo gol no Juventus, não me satisfazia sorrir; tinha que haver o brado de surpresa, de alegria, seguido de boas risadas de felicidade...
Sorri minha esposa Cleusa, quando preparou uma sobremesa gostosa no almoço, e nota como eu soube apreciar seus dons de ótima cozinheira, sua boa vontade em alegrar o marido...
Sorri o operário que pinta as paredes de meu sobrado, com rapidez e segurança, mostrando sua maestria no manejo do pincel, e na combinação das tintas...
Você, benévolo leitor, já acompanhou o sorriso de namorados que se acham em pleno enlevo no seu amor mútuo? Ele pode mostrar não importa o quê, ela pode responder seja lá o que for: tudo é pretexto para risos e sorrisos celestiais...
Dizem as más línguas que é mau sinal andar falando sozinho... E eu, do meu lado, confesso que sorrio muito sozinho. Quando o céu de minha Curitiba - o que infelizmente não acontece todo dia - está quase exagerando de tanta beleza; quando em nosso pequeno jardim doméstico desabrocham flores que poderiam participar de exposição em qualquer planeta; quando surgem as primeiras estrelas... Quando nas manhãs de domingo vou à feira, e nas bancas suas frutas recém-colhidas são uma tentação para quem tem filme colorido; quando encontro uma senhora grávida e penso na criancinha que logo, logo, vai assistir a prodígios incomparavelmente maiores do que a energia nuclear e a viagem interplanetária, para as estrelas;
Quando encontro sinais visíveis da ação do Pai de todos os pais, ou até as marcas da ação do homem, como sócio do Pai, como co-Criador com Ele, aí eu sorrio, sorrio, sorrio!...
Portanto, benévolo leitor, se este texto lhe desagradou, desamarre seu rosto. Não pense que cara séria o tornará mais palatável. Dê-me um crédito de confiança. Cara feia, para o povão, não é tanto falta de beleza: é cara enjoada, enfezada, cara de poucos amigos...
Não trinque os dentes. Não cerre os lábios. Deixe que eles se abram felizes, sorrindo para tudo e para todos, para os homens, para as mulheres. E, principalmente, sorrindo para Deus!
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