A Graziela, ou Grazi, minha nora, mãe do Guilherme e da Giovana, meus netinhos, cismou que o Guilherme é quem tinha perdido a chave do carro do pai. Exigiu, então, que ele virasse pelo avesso os dois bolsos de sua calça e os dois bolsos da sua jaqueta contra o frio.
Quanta coisa saiu de dentro daqueles quatro bolsos! Tudo, menos a chave do carro.
A Grazi foi ficando furiosa com o que lhe parecia bugiganga com que ele enchia os bolsos... Como é difícil para um adulto entender o mundo encantado das crianças!
Sabendo da história, pela Giovana, senti saudades do meu tempo de criança, perdido faz setenta e tantos anos, quando também meus bolsos eram iguaizinhos aos do Guilherme!
Um carretel vazio! A Grazi, apesar de toda a sua experiência de vida, podia lá entender que a coisa parecia de fato um carretel, mas era telefone espacial para contatar astronautas nos espaços siderais?...
Um pedaço de barbante!... Como a gente grande podia aceitar que se trata não de um vulgar barbante, mas de corda mágica a ser estendida de montanha a montanha, ou por cima das águas revoltas do rio, quando fosse preciso atravessar para a outra margem!?...
Pedrinhas de tamanhos, cores e formatos diferentes: aqui é que a coitada da Grazi ia mesmo torcer o nariz, sem poder de maneira alguma acreditar que eram pedaços da Lua, trazidos de lá por um astronauta!...
Vendo sempre sair de dentro dos bolsos do Guilherme as coisas mais absurdas e inesperadas, menos a danada da chave do carro, quando a Grazi viu aparecer um guizo já meio amassado, não aguentou mais e disparou:
- "Afinal, uma coisa que eu entendo... Um guizo! Você merece mesmo andar de guizo no pescoço, nas mãos, nos pés, seu palhacinho!..."
O Guilherme ficou triste, mas não disse nada. Eu, se fosse testemunha do caso, com certeza dava uma de intrometido, e dizia à desconcertada mãe:
- "Vai ver que se trata de guizo mágico, trazido por algum peixe do fundo do mar... Vai ver que é guizo que espanta a tristeza e traz a alegria... para certas mães que conheço!
Tive vontade de dizer, mas não disse. A Grazi não ia entender. Gente grande, principalmente se for mulher, aí é que não entende mesmo, até as coisas mais simples...
A Giovana, irmãzinha do Guilherme, me disse ainda que dos bolsos do Gui saíram mais coisas: vários grãos de milho, um prego, uma bolinha de gude, uma tira de pano, um retrato do Neimar...
A tira de pano estava na cara que era para enfeitar o papagaio... O pião devia ser o campeão de dança do mundo dos piões... Grãos de milho, com imaginação criadora, dá nascimento a tudo que se quiser...
O prego! Ora, o prego: mas que mania de querer explicação para tudo! Por que não deixar o prego para alguma surpresa?... Vai ver que antes da noite chegar ele vai ser usado e aproveitado uma meia dúzia de vezes...
Seria o cúmulo da burrice a Grazi perguntar a razão da presença do retrato do Neimar no bolso do Guilherme!...
Que paciência de Jó as crianças precisam ter com a gente grande!...
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(PS.: este texto é dedicado ao pai do Gui, Aroldo Júnior, pela passagem do Dia dos Pais!...)
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