domingo, 9 de junho de 2013

CORAÇÕES DE PEDRA, CORAÇÕES DE CARNE


          Ontem, sábado, deixei meu bairro, o Tingui, e fui ao centro, mais precisamente à Voluntários da Pátria, onde estão as livrarias que gosto de visitar. Desta vez fui à Livraria Paulinas, e ali, vistoriando estante por estante, consegui encontrar o livro que há muito andava desejando adquirir: aquele que traz a entrevista do Papa Bento XVI com o jornalista Peter Seewald. E aproveitei também a oportunidade, e comprei o CD "Pavarotti Forever...", alimentando uma de minhas fraquezas, que é a música italiana...
            Caminhando ali  pela Rua XV de Novembro, os seus grandes edifícios de cimento armado me pareciam frios, sem alma, distantes... Durante o dia, quando o movimento é mais intenso e a luz do sol mais ardente, os monstros de pedra e argamassa me parecem muito mais amedrontadores!
          Mas é curioso: quando o sol, no seu giro, se esconde entre as nuvens, os arranha-céus conseguem perder qualquer sombra de agressividade; seus ângulos se amaciam e os blocos gigantescos dão a impressão de recolher-se e de, quem sabe, rezar!?...
            Isto me fez pensar que é duro também lidar com criaturas que me parecem feitas de cimento armado, angulosas e difíceis. Entretanto não me esqueci de que os próprios monstros de tijolos e concreto não resistem de certo modo à magia do entardecer... Quase chegam a parecer humanos, voltados para a imensidão dos céus!
           Aí me passou pela cabeça, criatura humana que sou, que nenhum homem ou mulher deste nosso mundo é feito de tijolos, de cimento, ou de mármore... Não há ninguém, por mais duro que seja, que não ofereça brechas em suas fortalezas de eventual agressividade...
            Nos meus tempos de moradia no interior do Estado, mais precisamente na pequena e acolhedora cidade de Barbosa Ferraz, tive como vizinho um velhote durão, que adorava dizer NÃO a todos quantos lhe pediam qualquer coisa, mas que se desarmava inteiramente, nunca cheguei a descobrir a razão, quando lhe batia à porta um cego ou uma cega, conduzidos por um molecote.
          Conheci outro homem, também durão, que não podia ver uma mulher grávida, sem se comover profundamente. Isto me convenceu definitivamente de que todos nós somos de carne e osso. Mesmo que alguns nos pareçam ter coração de pedra, a grande maioria dos mortais, pela Graça de Deus, possuem um coração de carne, como disse o texto bíblico, afirmando que nos seria tirado o coração de pedra, e no seu lugar Deus nos colocaria um coração de carne. Este é o fato que nos anima e nos enche de gratidão.
            Por mais que os percalços da vida nos vão tornando por assim dizer insensíveis, por mais que nosso coração vá enrijecendo, há sempre algum acontecimento que faz acordar recordações que pareciam mortas; haverá sempre um gesto, um sorriso, um toque de mãos, enfim, que nos apanha de surpresa, mesmo os que são mais durões...
         Quem imagina não ligar a mínima para o nascer do dia ou para o pôr do sol, lá uma vez ou outra se defronta com entardecer diferente: destes que o gênio dos pintores costuma fixar nas telas, e a gente chega a dizer que eles exageram na pintura do incêndio de fogo a perder de vista...
          No livro de Dom Hélder Câmara, "Um olhar sobre a cidade", que ando lendo nestes dias, encontrei a afirmação de que às vezes a morte repentina de um amigo é um clarão da Graça para quem se considera sem alma, sem coração, sem nervos... E quando acontece, por qualquer circunstância, que uma criança, com sua espontaneidade, sua inocência despertadora, entra na vida de quem se imagina totalmente insensível, o que acontece!? É muito fácil prever; trata-se de uma experiência inolvidável!
      E eu me pergunto, acusando-me a mim mesmo: por que desanimar, mesmo quando lidamos com pessoas que nos parecem casos perdidos?
       Eis aí: caso perdido!... A nossa tragédia do dia-a-dia: Quem nos autoriza a julgar e condenar quem quer que seja?... Quem pode criar e colocar limites humanos à misericórdia de Deus?
         Por mais grossa e insensível que seja a carapaça do egoísmo; por mais paralisada e morta que pareça a nossa consciência, por mais que juremos que o coração de carne virou coração de pedra, não podemos menosprezar a Luz Divina que atravessa toda e qualquer barreira que tentemos lhe impor: tenhamos firme em nosso espírito e em nosso entendimento que Cristo, nosso Redentor, venceu a morte para sempre!...

    

            

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