I - Oração a meu santo padroeiro:-
São Luís de Camões, grão padroeiro
De meu ousado vôo em busca da Arte:
Eis-me aqui a teus pés, a suplicar-te
Que sejas o meu guia e conselheiro.
Eu te louvo, Camões e, com louvar-te,
Dou-te provas de afeto verdadeiro
Este Poema, de todos o primeiro,
Levando-o comigo a toda parte.
Diante do teu estro que me assombra
Rebenta em borbotões, à flor dos lábios,
Este soneto que exaltar-te vem.
Arbusto humilde que nasceu-te à sombra,
Aceita-o, ó sábio entre os mais sábios,
Nos séculos dos séculos. Amém.
II - Viver:-
Cai a procela num rugir tristonho,
Sibila o vento num furor infrene;
Nessa tormenta em que a natura treme
Rutila o raio com fragor medonho.
Enchendo o nauta de pavor mortal
As ondas bramam no oceano irado;
Com as velas rotas o batel ousado
Do mar enfrenta o vagalhão fatal.
A nossa vida é um batel perdido,
Que em meio ao negro turbilhão do mundo,
Com as velas rotas navegando vai...
A nossa vida é um batel perdido;
Frágil batel, que sobre o mar profundo,
A pouco e pouco num gemer se esvai!
III - Noturno:-
Seguindo a minha estrela triste e escura
Fui por remoto mar em lenho lenho,
Buscando para a vida sem ventura
Bonanças da ventura que eu não tenho.
No entanto só me coube a sorte dura
Que em todo tempo maldizendo venho:
O anseio de buscar na sepultura
O prêmio desta vida que desdenho.
É grande o desconcerto do meu fado,
Pois nenhum breve gozo ele consente
Ao pobre trovador desventurado.
Assim, eu vou chorando a triste sorte
Que me tornou um mísero descrente,
E fez-me odiar a vida e amar a morte.
IV - Se:-
Se o fogo que em meu peito jaz sepulto
Recalcado por todas convenções;
Se as chamas de desejos que eu oculto
Não tivessem o freio das sanções:
Se os homens renegassem o seu culto
Imoderado às leis e restrições,
De modo que eu pudesse, livre e inulto,
Satisfazer meus sonhos e ambições:
Se todos fossem existencialistas,
Vivendo sua vida integralmente,
Sem temerem jurados nem juristas:
Enfim, se nesta terra miserável
Existissem prazeres tão somente,
Tu serias, ó mundo, formidável!
V - Misantropia:- ("Odi profanum vulgus et arceo" - Horácio, Ode I)
Eu odeio e detesto a plebe vil e abjeta
Que ao me ver a cismar nas curvas do caminho,
Com ironia diz a quem lhe está vizinho:
- Ou é um pobre louco, ou mísero poeta!
Buscando a misteriosa e suspirada meta
Onde a Poesia verdadeira tem seu ninho,
Sem nunca adormecer à sombra de um carinho,
Eu vou vivendo, assim, qual solitário asceta.
Se for moléstia odiar um homem a outro homem,
Desejo se prolongue a minha, muito embora
Sofra eu dores cruéis que aos poucos me consomem.
Odeio a todos. Amo apenas a Poesia
Que em seus braços me abriga, em me tirando fora
Da sociedade vil, hipócrita, sombria!
VI - Lacrimae rerum:-
Sempre que morre o sol invade-me a tristeza!
Em minh¹alma então sinto o fel da desventura,
E horas fico a cismar se esta cruel tortura
Nasce de mim ou da impassível natureza.
Ao ver sumir o sol no abismo que o devora
- Em meus olhos brotando as lágrimas do pranto -
Já não sei, confundido entre a surpresa e o espanto,
Se choro a sua dor, ou se ele é que me chora!
A pouco e pouco sobre os vales anoitece;
Tudo se vai sumindo, enfim, desaparece;
Uma folha sequer se vê da espessa alfombra.
No meio deste caos imenso, desta calma,
Eu já não sei se a sombra é que me invade a alma,
Ou se é de minh¹alma, enfim, que nasce a sombra!
VII - Mariazinha:-
Mariazinha, a mais faceira
Das irmãs minha onde está?
- Ao velho bosque foi, ligeira,
Procurar lenha e volta já.
Ó meu amigo, vamos fala,
Por que ela ainda não voltou?
- Já foram muitos procurá-la,
Ninguém no entanto a encontrou...
O que será que aconteceu?
Por que esses prantos, esses gritos?
Algo terrível sucedeu?
Mariazinha regressou?
- Trouxeram só seus sapatitos:
Dizem que um lobo a devorou!
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