domingo, 28 de abril de 2013

A PARÁBOLA DA ESPERANÇA


          -"Que fizestes das esperanças dos homens e das mulheres? Que fizestes do Senhor Jesus, esperança do mundo?"
           "Vivemos num tempo em que numerosas pessoas estão sem esperança!" - proclamava tempos atrás o Conselho Ecumênico das Igrejas.
       Muitos cristãos, por seu lado, fizeram da sua esperança uma caricatura, uma espécie de álibi disfarçando a sua deserção perante os encargos da vida. Não sabemos mais o que significam as palavras: nos velhos bons tempos, quando a esperança era esperança de alguma coisa, aspiração para uma enseada, um porto, o que indicavam os olhos, claros faróis, da doce amada, aquele que atraía os esforços do náufrago. Sabemos que a esperança era árdua, que reclamava esforços, mas "a esperança faz viver", dizia-se, porque um dia ou outro se alcança o porto.
         Milhares de homens e de mulheres, neste nosso mundo, aguardam um mínimo de felicidade; e têm razão, devemos ter a coragem de dizer. Que pensariam eles da capa de uma revista de circulação internacional mostrando em primeiro plano soldados com fuzis e metralhadoras, e em segundo plano a fumaça de incêndios devorando cidades? E no entanto seres humanos ousaram chamar essa operação de "ofensiva esperança"...
         "Nosso tempo é um tempo de esperança!" - proclamava a moção final do Congresso pela Paz e pela Civilização Cristã, reunido em Florença, na Itália. 
      Para compreendê-lo é preciso decifrar o sentido dos acontecimentos. Os cristãos necessitam convencer-se da ambiguidade de todas as situações históricas concretas nas quais devem encarnar a sua esperança teologal. Aliás, uma das maiores razões da propagação da esperança marxista, tempos atrás, estava justamente nesta alienação dos cristãos em face dos momentos históricos que viviam.
         Sei de um escritor francês que num rasgo admirável de autocrítica percebeu claramente a omissão e as consequências dessa omissão cristã diante dos caminhos do mundo. E o fez com estas palavras:
         - "O sofrimento e a derrota são a intervenção de Deus para que o homem não se instale numa condição que não é a beatitude, sua vocação. Na história de Israel, bem como na história da Igreja, os inimigos e os adversários têm uma função providencial. Cada vez que a Igreja deixa perder ou negligencia uma partícula da verdade de que é depositária e que tem a obrigação de fazer frutificar, um adversário se levanta - ironia da história! - justamente em nome desse fragmento de verdade que a Igreja abandonou, e ataca os cristãos em nome dessa verdade parcial. Pense-se na utilidade da Renascença, que salvou a Igreja da tentação do governo temporal e da tirania intelectual. Pense-se em Nietzsche, que nos ajudou a não fazer do Cristianismo uma ética mórbida; em Freud, em Marx. Cada adversário se tornou indispensável por uma fraqueza dos cristãos. Se os cristãos nada mais anunciam aos pobres, outros anunciarão aos pobres a justiça; mas em troca investirão contra a Cristandade para a despedaçar, como outrora o assírio e o egípcio atacavam Israel e o devastavam, quando ele se mostrava infiel ao Deus da Aliança. A verdade não mais pode estar ausente da Terra. Quando a verdade deixa de ser guardada e servida com energia suficiente pelo Corpo que tem o encargo de guardá-la, emigra e suscita um homem ou um movimento que se tornam campeões justamente dessa parcela de verdade abandonada pelos cristãos." (Claude Tresmontant)
         Mais do que qualquer outra coisa, os cristãos devem tomar a seu cargo a esperança de homens e mulheres. É necessário dar à esperança todas as suas dimensões, porque sei também de um cristão, e dos bons, que lançou na Semana de Intelectuais Católicos da França, uma frase verdadeiramente aterradora:
            -"Nós raptamos o Senhor, e o resto do mundo não sabe onde O pusemos... Talvez a grandeza do século a que pertencemos esteja em tornar Cristo acessível, se assim me posso exprimir, ao resto do mundo." (François Mauriac).
          Para quantos milhões de seres humanos o Cristianismo não passa de uma religião exclusivamente ocupada da salvação da alma, quando não é identificada com uma evasão mórbida diante do mundo, uma obsessão da carne, um medo de tudo que é humano?
            Nós vivemos numa época espiritualmente incomparável e grandiosa, porque rica em possibilidades e em perigos. Mas se ninguém for capaz de se colocar à altura das suas exigências, ela poderá converter-se na era mais miserável da História, marcando o retrocesso da humanidade.
           Entretanto, a Criação inteira espera; NOS espera!
           E estaremos nós prontos para apostar tudo pela salvação dos homens e mulheres do mundo inteiro?


                                                         **************************

1  - Bianca
2  - dibali
3  - Welington
4  - Bíblia palavra de Deus
5  - Carlinhos
6  - Carlos Almeida
7  - Elizeu
8  - Walter Filho
9  - Coração que Pulsa
10- José Orlando
11- Petescadas
12- JBCampos
13- Sidney
14- Sibinoti
15- Eliz
16- Márcio Mendes
17- Graziela
18- Júlio Almeida
19- Márcio Mendes
20- Aroldo Jr
21-Celso Ferreira

A todas estas ilustres pessoas, e a todos mais que me dão a honra de serem leitores dos meus modestos textos, o meu sincero agradecimento por esse gesto de coragem e de boa vontade. Aroldo

                                                             *********************

sexta-feira, 26 de abril de 2013

A BÍBLIA SAGRADA NA BERLINDA


          A Bíblia Sagrada, ou Escritura Sagrada, e eu o creio, é um tesouro inesgotável de experiências profundas e de sublimes intuições religiosas. Esse tesouro, porém, chega até nós vindo de uma cultura há vários séculos de distância, nascido em uma sensibilidade milenarmente distinta e responde a perguntas ou necessidades concretas que já não são, de forma alguma, as nossas.
            A Bíblia é de fato, para o crente,  palavra de Deus, ou melhor, no meu entender, é testemunha da palavra de Deus, pois nela se expressa tudo aquilo que Deus quis manifestar-nos, nunca diretamente, mas sempre, e necessariamente, nas e com palavras humanas, por meio das quais consegue expressar-se. E estas palavras humanas, apesar de serem autêntica manifestação de Deus, trazem a marca de seu tempo e lugar. Traduzem toda a manifestação de Deus que chega até nós, é verdade, mas nos modos limitados de uma subjetividade, de uma sociedade, de um tempo e de uma cultura bem determinada.
         - "Os moldes conceituais da Bíblia Sagrada, os marcos de referência de seus significados, os significantes simbólicos dos quais lança mão, desapareceram ou, em muitos casos, perderam sua transparência para a cultura atual."  (Queiruga, "Hacia una nueva imagen de Dios").
         A verdade é que os textos da Escritura se apresentam marcados pela época de sua elaboração, a tal ponto que dificilmente podemos entender como esses documentos tão longínquos ainda podem falar-nos  nos dias de hoje.
         O que se disse e se viveu naquela época tão distante, com as palavras, as imagens e os símbolos que os hagiógrafos tinham então ao seu alcance, cumpre-nos expressá-los hoje com nossos meios atuais e a partir de nossa situação. Mas temos de fazê-lo de maneira que, através das palavras antigas e de uma sadia inculturação, a mesma realidade possa ser falada também em nossa língua e situação atual.
       Não podemos permanecer enclausurados na repetição por assim dizer, mecânica, de um passado morto, mas devemos abrir-nos para a recriação autêntica de uma experiência que há de ser tão atual como a refletida nos textos tradicionais, e que exige de nós seja traduzida em palavras vivas que falem à nossa compreensão. Além disso, devem alimentar as possibilidades de nossa vida e de nossa história nos tempos em que vivemos. Gostemos ou não, temos que pagar nosso tributo à pós-modernidade e aos sinais dos tempos, como diria o saudoso Papa João XXIII.
          Atualmente, nenhum estudioso sério da Bíblia admite que ela seja resultado de um "ditado" divino ao hagiógrafo, como ainda se pensa em alguns setores fundamentalistas "evangélicos" e católicos. A crítica bíblica tem mostrado cada vez com maior clareza que a Bíblia foi gestada aos poucos, no longo acontecer da História, através de intenso trabalho de reflexão religiosa a qual, por meio da experiência de sempre novas situações vivenciais, foi descobrindo novos aspectos da presença divina no mundo.
         Através dessas experiências, o hagiógrafo intui o que Deus está tentando nos manifestar, não através de "ditados" ou de intervencionismos físicos, mas da capacidade significativa que adquirem certas situações específicas pessoais ou históricas. Por exemplo: na beleza e esplendor do céu, o salmista intui a glória do Criador. No sentimento de rebelião contra a opressão egípcia, Moisés desvenda que Deus se compadece dos oprimidos e quer a sua libertação. No seu amor e no sentimento profundo de perdoar sua esposa adúltera, o profeta Oséias descobre o perdão e o amor incondicional de Deus, apesar de toda a infidelidade humana.
          "Toda experiência religiosa é sempre vivida como suscitada por Deus, e bem por isso é vivida como revelada. Deus está sempre atuando a partir da iniciativa absoluta de Sua ação salvadora, e que tão somente graças a essa iniciativa se pode produzir a descoberta reveladora." ( Queiruga, "A Revelação de Deus na Realização Humana").
          É preciso também que tenhamos sempre em conta que os autores bíblicos, a seu tempo e a seu modo, por não terem chegado ainda a uma concepção mais exata da face de Deus (só possível após a vinda de Jesus ao mundo), podiam declarar a Seu respeito palavras e ações que muitas vezes não eram na verdade nem palavras nem ações de Deus. Eles simplesmente supunham que Deus nesse momento falava ou agia assim, mas muito diferente era o modo como Deus falava ou agia na realidade.
         Um exemplo entre muitos: o segundo Livro dos Reis nos apresenta a revolução de Jeú e a matança que levou a cabo como algo querido e mandado por Javé. Entretanto, um século mais tarde, o profeta Oséias condenou energicamente em nome do próprio Deus aquele derramamento de sangue que aconteceu no tempo de Jezrael.
           Ou pense-se ainda nos castigos coletivos, "ate a terceira e quarta gerações", ou arbitrários, como o do filho do sumo sacerdote que queria salvar de uma queda a Arca da Aliança, mas foi fulminado por Deus porque a tocou. "Davi teve medo do Senhor naquele dia", diz-nos o 2Sm 6,9.
       Qualquer  pessoa de bom senso perceberá claramente que tais fatos narrados pela Bíblia correspondem não à vontade divina, mas à mentalidade do tempo. Naquela época, interpretavam que isso era o que Deus queria, e por essa razão o atribuíam a Ele. Mais tarde, após um longo e duro processo de reflexão e de aprofundamento na intelecção da real natureza de Deus, a  própria Bíblia deixa de pensar assim, e naturalmente ninguém hoje nega que isso é inconcebível, e que com toda certeza Jesus de Nazaré jamais diria uma coisa dessas. 
             Conclusão: conforme o contexto, não nos é lícito interpretar como palavra de Deus o que é palavra de homens. Os desejos de vingança de Jeremias ou do salmo 137 (136), por exemplo. A verdade é que uma palavra de Deus, pura, não contaminada por distorções humanas em diferentes medidas, não existe. Pelo contrário, a recepção, a compreensão e a interpretação devem ser aceitas como intrínsecas à própria palavra revelada.
               Em consequência, não aceito uma leitura literalista ou fundamentalista da Bíblia, isto é, tomar ao pé da letra o que nela está contido, sem uma segura exegese histórico-crítica de seu conteúdo. Muitas denominações ditas evangélicas fazem isto, e acabam resvalando para os maiores absurdos interpretativos. Vários setores do catolicismo também o fazem, inclusive certas partes do "Catecismo da Igreja Católica", bem como a comunidade "Canção Nova", sem esquecer, é claro, a maioria das pregações nos púlpitos de nossas igrejas.
                Por causa dessa leitura fundamentalista da Bíblia, há muitas verdades que os cristãos, católicos e protestantes, afirmam, mas no íntimo chegam a não crer nelas. São demasiadas as palavras da Bíblia que dizem aceitar, mas suspeitando que alguma coisa pode não ser bem assim como está lá, conforme o que ouvem nas pregações de seus guias espirituais.

                                                     ****************************************

A minha prece de todos os dias, de todas as horas, de todos os momentos:

                                                     Se eu pudesse
                                                     na hora mais dolorosa
                                                     do sepultamento de minha filha Raquel
                                                     quando a sua urna funerária
                                                     era colocada túmulo a dentro
                                                     eu faria
                                                     que uma revoada de andorinhas
                                                     pairasse por sobre os presentes
                                                     testemunhando
                                                     a sua ressurreição NA morte
                                                     que é a Fé que me anima e me conforta
                                                     e me mantém vivo até hoje
                                                     Oh! como seria bom
                                                     Se eu pudesse!...

                                                   *****************************************
  





           



          
          

quinta-feira, 25 de abril de 2013

O HEROÍSMO ANÔNIMO


      Neste nosso mundo, que me parece carregado de pecados, sem esquecer os meus, que não são poucos, seria fácil investir contra os que não são de grandes pecados; não são de grandes covardias, mas também, em contrapartida, carecem de grandes coragens.
        Esses, querem viver tranquilamente, em paz consigo mesmos, com os seus e com os outros. Aliás, seria fácil invocar um argumento de autoridade, utilizando uma palavra terrível da Bíblia, quando nela encontramos esta frase: "Deus vomita os tíbios."
         Se é verdade que o cidadão médio não tem vocação para grandes lances de heroísmo, é também verdade que ele, no seu dia-a-dia, vive momentos de heroísmo anõnimo, porque na vida de todos nós é impossível fugir dos sacrifícios normais de todo dia e de cada instante.
          O motorista de táxi, por exemplo, numa cidade turbulenta como Curitiba, que hoje estou conhecendo bem, talvez enfrente a educação de quatro filhos; a esposa costureira, que faz malabarismos diários para completar o minguado salário do marido; a moça que ainda não arrumou casamento, mas cuida, de coração, de sete sobrinhos, filhos de dois irmãos, que precisam trabalhar dez horas por dia para sobreviver.
         Sem os que se sacrificam na sombra, sem os que assumem a labuta inglória do quotidiano, o cinzento do dia-a-dia, poderiam alguns dedicar-se aos de fora, no serviço desinteressado e anônimo em favor da grande família humana?
        Enquanto o cidadão e a cidadã, médios, comem o pão da mesmice de todo dia - mesma casa, mesmas caras, mesmas vozes, mesmos problemas domésticos ou profissionais - outros dedicam-se, é verdade, gastando-se a si próprios, sem medir esforços, sem calcular prejuízos, aceitando sobrecargas, no trabalho por assim dizer anônimo em favor dos mais frágeis e necessitados de ajuda alheia. Estes, muitos ou poucos, em geral são vistos, chamam a atenção, são louvados e postos como exemplo para outros.
      Seria injusto e nada inteligente menosprezar a criatura humana média e os que estão na linha de frente do trabalho comunitário. Neste caso, atitude decisiva seria o reconhecimento - não por habilidade, por diplomacia, por esperteza; mas por justiça e convicção - do heroísmo anônimo de tantos que se entregam, que se doam, em benefício de seu próximo, muitas vezes sem o retorno de sequer um "muito obrigado"!
       Compreendida, vendo sua atitude devidamente valorizada, a criatura média até se alegrará que outros de sua comunidade possam ter vocação diferente e se sentirá feliz em dar sua parcela de colaboração para o bem coletivo, desempenhando um papel de enorme relevância social e, por que não dizer, cristã?

         

quarta-feira, 24 de abril de 2013

MEU DIÁRIO - O DIÁRIO DA SAUDADE


24 de abril de 2013:-

Tive o diabo de um susto hoje de manhã: estava conversando com a Raquel, contando-lhe que sua mãe e eu  estivemos esta semana no Colégio, junto à coordenação pedagógica, tratando de assuntos referentes à Isabela e seus estudos. Foi aí que alguém me apostrofou: - "Você está ficando biruta? Falando sozinho em voz alta?"   É verdade: eu conversava com a minha filha Raquel em voz alta. Então me dei conta de que a Raquel já havia falecido há dois anos e oito meses atrás. Confesso que, então, chorei. Mas tive um consolo: apesar de estar falando sozinho, minha conversa era com a Raquel, e tenho a firme certeza de que ela, junto a Deus, no Seu Reino, ela, em Deus, ouviu minha voz e, no momento oportuno, no fundo de meu coração, ouvirei também sua resposta, que me trará o consolo de que tanto preciso, deixando claro para mim que, apesar de sua ausência física entre nós, ela está presente sempre entre nós, velando por sua filha Isabela, velando por seus chorosos pais, velando por seus irmãos Carlos, Júlio e Aroldo Jr.
Que minha inesquecível Raquel descanse em paz no Reino de Deus onde, um dia, talvez muito em breve, eu estarei também ao seu lado, por toda a eternidade!

E faço minha prece de todos os dias, de todas as horas, de todos os momentos:

                                            - "Se eu pudesse
                                                na hora mais dolorosa
                                                do sepultamento da Raquel
                                                quando a sua urna funerária
                                                era colocada túmulo a dentro
                                                eu faria com que
                                                uma revoada de andorinhas
                                                pairasse sobre os presentes
                                                testemunhando 
                                                a sua ressurreição NA morte
                                                como é a Fé
                                                que me anima, me conforta
                                                e me mantém vivo até hoje
                                                Oh! como seria bom
                                                Se eu pudesse!"

                                    *************************************

       Lendo o evangelho de Marcos:-

     À tarde li, do começo até o fim, capítulo por capítulo, todo o Evangelho escrito por Marcos. Foi uma  formidável aventura.  E aí eu vi, cada vez de novo, que o Evangelho de Marcos informa, sempre, que Jesus está a caminho., "a caminho para Jerusalém"!, onde encontrará a Cruz. E lembro que o livro dos Atos dos Apóstolos usa a palavra Caminho para designar a nascente Comunidade Cristã. Hoje talvez disséssemos Caminhada.
     Discípulo e discípula é quem segue Jesus neste caminho, nesta caminhada para Jerusalém. É o caminho da entrega, da doação, do serviço, da aceitação do conflito, do abandono, do serviço, mas também da certeza de que no final haverá a ressurreição.
    A cruz faz parte deste caminho porque, no mundo, organizado a partir do egoísmo, o amor e o serviço só podem existir crucificados! Quem faz da sua vida um serviço aos outros incomoda os que vivem agarrados aos privilégios.
    E os Evangelhos nos afirmam sempre que Jesus se mantém no Seu caminho. Poucos dias antes da Páscoa, acompanhado por discípulos e multidões, vindos de toda a Galiléia, Jesus entra na capital. O povo que O acompanha e os discípulos tomam as ruas de Jerusalém, introduzem Jesus como o Messias e O aclamam em altas vozes: - "Bendito o que vem em nome do Senhor!" 
     Jesus aceita a homenagem do povo, mas com reserva. Montado num jumento, Ele evoca a profecia de Zacarias, que dizia: _ "Teu rei vem a ti, humilde, montado num jumento."
     Os discípulos, que entendem o gesto simbólico e se convertam! Jesus não aceita ser Messias, ou Rei guerreiro. Ele se mantém no caminho do serviço, simbolizado pelo jumento, simples animal de carga.
     Na sequência do Evangelho de Marcos, Jesus rompe com o Templo, rompe com os sumos sacerdotes, rompe com os fariseus e com os partidários de Herodes, rompe com os escribas e com os fariseus, e aponta aos que O seguem onde se manifesta a vontade de Deus.
      Em todos estes momentos tensos e críticos, os discípulos estão com Jesus. No fim, sentado em frente ao cofre de esmolas do Templo, Jesus chama a atenção deles para o gesto de uma viúva pobre que soube partilhar até do seu necessário.
     Na verdade, os discípulos eram de opinião de que o problema maior do povo só poderia ser resolvido com muito dinheiro. Por ocasião da multiplicação dos pães, eles tinham dito a Jesus: - "O senhor quer que vamos comprar pão por duzentos denários para dar de comer ao povo?"
      Para quem pensa assim, os dois vinténs da viúva não serviriam para nada. Mas para Jesus "esta viúva, que é pobre, lançou ao cofre mais do que todos os que ofertaram moedas ao tesouro do Templo."
      Jesus tem critérios diferentes deles, como também de nós. Chamando a atenção dos discípulos para o gesto da viúva, Ele ensina onde eles e nós devemos procurar a manifestação da vontade de Deus, a saber, nos pobres e na partilha com os pobres.
     Jesus rompeu com tudo: com o Templo, com os sacerdotes, com os anciãos, com os fariseus, com os herodianos, com os saduceus, com os escribas, com a ideologia da religião oficial! No fim, ele sai do Templo e de Jerusalém. Sentado no alto do Monte das Oliveiras, Ele olha para o Templo e termina a instrução fazendo o Seu último discurso para apenas quatro discípulos: Pedro, Tiago, João e André, que Lhe tinham feito uma pergunta sobre a destruição do Templo e o fim dos tempos.
      Na resposta, Jesus os esclarece sobre as perseguições e sobre a necessidade da vigilância, alertando-os para que não se deixassem enganar por falsos messias, e que todos eles fiquem sempre bem vigilantes!


                                                        **********************
    
    
      



                                       

segunda-feira, 22 de abril de 2013

A VOZ DE DEUS, AQUI E AGORA


          De  Abraão e de outros Pais de crentes e Condutores de multidões se diz que ouviram a palavra e o chamado de Deus. E quanto a nós, que também nos dizemos crentes, poderemos também ouvir a voz do Senhor? E, neste caso, querer ouvir a voz do Senhor, como os antigos profetas, não seria uma pretensão descabida, ou vaidade perigosa?
         Quem vive como nós, na América do Sul, e mais precisamente no Brasil, sabemos que ao nosso redor milhões de criaturas vivem de modo sub-humano, praticamente em condições de quase escravidão? E se não formos afetados pela surdez, seríamos capazes se ouvir o clamor dos oprimidos em nossa sociedade capitalista, egoísta e alienada socialmente? E saberíamos nós que o clamor dos oprimidos é a voz de Deus falando à nossa consciência?
      Quem vive em países desenvolvidos e ricos, mas onde, em contrapartida, existem também zonas cinzentas de subdesenvolvimento e de miséria, se tiver antenas espirituais sintonizadas para o próximo, certamente ouvirá o clamor silencioso dos sem-vez e sem-voz. E o clamor dos sem-vez e sem-voz é a voz de Deus a apostrofar-nos.
         Em meu último texto falei da realidade trágica da favela. Falo agora, despertado mais de uma vez para as injustiças geradas pela má distribuição da riqueza, e quem tiver grandeza de alma, será capaz de captar os protestos silenciosos, e muitas vezes, o compreendemos, os protestos silenciosos dos pobres. E é bom que saibamos que o protesto dos pobres é também a voz de Deus.
        Quem acorda para as injustiças nas relações entre países pobres e impérios capitalistas ou socialistas, notará que, em nossos tempos, as injustiças já não ocorrem apenas entre indivíduos e indivíduos, ou entre grupos e grupos, mas entre países e países. E a voz dos países injustiçados continua também sendo a voz de Deus.
         Para nos despertar, Deus se serve até dos gestos de radicalismo e de violência. É que Ele sabe tirar o bem, eventualmente, do próprio mal. E seremos tão surdos a ponto de não perceber que o Deus de amor nos alerta para o perigo real de a humanidade caminhar para o suicídio?
      Seremos tão egoisticamente fechados de modo a não notar que o Deus da Justiça exige que nos movamos e tentemos um esforço sincero para que as injustiças não continuem a asfixiar o mundo e a preparar a guerra, seja em nosso lar, no meio em que vivemos, em nosso país ou no mundo?
        Seremos tão alienados, tão distantes e tão frios, de maneira a dar-nos ao luxo de procurar Deus, em horas cômodas de lazer, em templos luxuosos e cheios de conforto, através de liturgias pomposas e ricas e, não raro, vazias de sério conteúdo, sem Cristo, ou sem que nós O vejamos, sem ouvi-Lo, sem tocá-Lo, lá onde Ele está, e nos espera, e exige nossa presença? E  isto, junto ao humilhado, junto ao pobre, junto ao oprimido, sendo infelizmente nós, muitas vezes, coniventes e cúmplices desta situação de injustiça?
        É fácil, relativamente fácil, escutar o chamado de Deus através do nosso tempo e do nosso meio. Difícil é não parar em atitudes emotivas e compaixão e de pesar.
        Dificílimo é arrancar-nos do comodismo, quebrar estruturas interiores - as mais duras e penosas de serem quebradas - deixar-nos revolver pela Graça; decidir-nos a mudar de vida; a CONVERTER-NOS!
      
           
          

    

sexta-feira, 19 de abril de 2013

PELOS SUBÚRBIOS DA VIDA


          Foi ali, nas baixadas do Ipiranga, que eu vi pela primeira vez a favela. Um arrepio percorreu-me o corpo, quando o seu cheiro pegajoso me lambuzou de alto a baixo como uma doença viscosa e ruim.
           A favela me deixou imensamente triste. Não tanto pela miséria encarnada em cada rosto que me fitava arredia e desconfiadamente. Mas porque ali, no torvelinho imenso dos barracos dependurados pelo morro, percebi o Cristo desamparado, atirado à margem da estrada como um farrapo qualquer, pela sociedade egoísta e pela incúria dos governantes.
           Estudante de Teologia na Faculdade Nossa Senhora da Assunção, em São Paulo, cheio de boas intenções eu fora à favela na tentativa de levar a mensagem de Cristo àqueles irmãos meus, que eu julgava repletos de pecados e irremediavelmente condenados ao inferno, se não lhes fosse pregada a palavra da salvação. Eu me esquecia de que eles já viviam o inferno verdadeiro, muito mais candente e terrívl do que o inferno aprendido no catecismo.
          A favela, porém, desde o primeiro instante, transformou em pó os meus belos sonhos de evangelizador, atracou-se comigo, atirou-me ao chão, violentou-me inexoravelmente, e eu me sujeitei a ela. Mostrou-me cruamente que o Cristo que eu pretendia levar-lhe era um cristo quimérico, estudado nas assépticas aulas de Teologia, um cristo-fantoche criado pela minha fantasia idealista, um cristo fabricado artificialmente na atmosfera alienada do seminário.
          Despojado repentinamente de todas aquelas certezas inabaláveis que até então conduziam minha vida de candidato ao sacerdócio diocesano, eu me vi nu e indefeso diante da realidade desumana da favela, que me mostrou, como o clarão de um relâmpago, a face verdadeira do Cristo, encarnado em cada um daqueles deserdados da sorte que eu, do alto de minha suficiência filosófica e teológica, pretendia salvar.
          Ali estava o Cristo oculto atrás das mãos furtivas e ágeis do pivete; ali estava o Cristo debaixo da maquiagem vulgar e escandalosa da menina-moça, que vendia o corpo quase ainda impúbere a fim de comprar remédios para o irmãozinho tuberculoso que definhava num leito de enfermaria; ali estava o Cristo disfarçado no traficante de drogas, que foi levado ao comércio infame pelo desemprego institucionalizado e pela fome da mulher e cinco filhos anêmicos e raquíticos, que pediam ao menos algumas migalhas de vida.
          O choque foi tremendo para mim. O Cristo que encontrei na favela nada tinha daquele "meigo e doce nazareno," que os padres lustrosos e bem nutridos  do seminário tentavam me mostrar nas páginas mal lidas dos Evangelhos.
          Eu compreendi num relance que se é verdade que o Cristo se identifica, segundo o evangelista Mateus, com cada ser humano que sofre, que padece fome e sede, que definha numa prisão, que se decompõe num leito de hospital, ou que está despido e com frio - então a favela me mostrou, sem sombra de dúvidas, o que sete anos de seminário não conseguiram fazer: ali na favela é que estava o verdadeiro Cristo com quem eu devia identificar-me, transformar no meu próprio sangue os Seus sofrimentos, os Seus cravos, a Sua coroa de espinhos, a Sua cruz, enfim, se eu quisesse realmente ser Seu discípulo. O cristo-prostituta, o cristo-pivete, o cristo-traficante de drogas, o cristo-bicheiro, o cristo-encurralado nos pátios malcheirosos da FEBEM, o cristo-torturado e cheio de estigmas pelo corpo, fruto da truculência e dos cassetetes da polícia militar.
        Sim. Eu vi a favela. Mil e um barracos acotovelados, enrodilhados sobre si mesmos, abraçados todos num amplexo violento de intrigas e violência. Lá pelas bandas do Ipiranga, na tumultuosa e milionária metrópole paulistana.

                                                  ***************************

            Vinte anos depois, não mais candidato ao sacerdócio, mas agora definitivamente padre, endurecido e calejado nas refregas da vida, eu estava de novo na favela. Fora chamado para celebrar a mais estranha das missas de todo o meu sacerdócio, na qual a Hóstia oferecida em oblação a Deus não seria nem o pão nem o vinho. No altar do sacrifício eu ergueria aos céus o corpo, o sangue, as amarguras, as frustrações, os sofrimentos e humilhações sem conta; eu ofertaria a Deus-Pai a vida, paixão e morte do Cristo-favelado!

                                                ****************************

          O vento ia e vinha na madrugada fria e garoenta. Namorava a goiabeira, cercando com carinhos de mãe o fruto barato e disputado pelas crianças da favela: a goiaba quase sempre cheia de bichos. Depois, espraiava-se pelas vielas mal-cheirosas, passava seu acalanto pelos ralos arbustos à beira do córrego de águas pretas e fétidas, descia e subia pelas ladeiras, chutando ciscos, papéis e latas vazias de cerveja. Acabou arrombando uma janela feita de sacos de aniagem e penetrou buraco a dentro, acordando com a sua mão gelada as pálpebras endormidas e cansadas do pivete.
          Olhar o céu pela abertura escancarada é um consolo e uma alegria. Quanta riqueza, quanto esbanjamento de estrelas, quantos mistérios atrás de cada nesga de nuvens. E lá bem longe, por sobre o posto policial sempre fechado, sem precipitação alguma, sem pressa ou afobamento, funcionário público estabilizado, lá vinha o sol preparando-se para assinar o ponto de mais um dia de trabalho.
          As coisas lá fora pareciam melhores. Dentro do barraco, a chama do lampião a querosene se enroscava com certa graça pelos trastes que imitavam moveis, tremelicava  por vezes diante do vento, quando não se punha toda encolhida  sobre si mesma, como faz a criança amedrontada pelo braço materno ameaçando castigo. Depois, expandia-se novamente, alegre e buliçosa, olhando para todos os cantos que teimavam em querer ficar nas trevas.
          No precário aconchego do barraco, um raio furtivo de sol mexeu com o cheiro acre de suor e urina de cinco crianças amontoadas sobre trapos, procurando aquecer-se mutuamente; foi ouvir o ronco sibilante e asmático de um ser que se fizera mãe por amor, e agora se tornara escrava para não perder a glória conquistada.
          Amanhecia na favela.

                                            *******************************

          O rapazola respirou fundo, espreguiçou-se, saiu do barraco e entrou pela estrada. Deixou para trás a mãe e quatro irmãos menores. Será que se esquecera de que ele também era menor de idade?
          O rapazola entrou na estrada. E a estrada o fez de novo criança. Uma criança franzina, desconfiada, olhada com reserva pelos adultos ressabiados, que se crispavam nervosos quando cruzavam com ele pelas vielas do morro.
          Os becos escuros da favela iniciaram-no na vida com o brinquedo predileto de mocinho e bandido, e este brinquedo se tornara dura realidade no dia em que seu pai fora sequestrado de madrugada por dois brutamontes do DOI-CODI paulistano.
           Clamara na fábrica por melhores condições de trabalho e de moradia, e fora posto na rua sob a acusação de subversivo. Reclamara do desemprego forçado, pedira trabalho em qualquer oficina, onde quer que houvesse vagas. Disseram que estava fomentando a luta de classes.
          A verdade é que frequentara o sindicato, participara de piquetes em portas de fábricas, jogara pedras na polícia de choque, intoxicara-se com o gás lacrimogêno, lembrara aos poderosos que "todos nós somos irmãos."
          - "Ele quer é o comunismo ateu! Ele quer é subverter o sagrado direito de propriedade!"
          Um dia os esbirros do DOI-CODI o levaram, e o tempo se esqueceu de devolvê-lo vivo à família. Os boletins oficiais disseram que fora atropelado numa tentativa de fuga! A mãe, coitada! ficara só. Tornara-se pai e mãe. Dera à luz, por amor, a cinco filhos. Agora, para sustentá-los, fizera-se farrapo: vendera a beleza, que ainda lhe restava, à dura faina de catadora de papéis nas avenidas da Capital. Perdera a energia no trabalho pesado e ininterrupto; vencera o orgulho natural da pessoa em troca de um mísero salário de fome.

                                            *******************************

          - "Que belo garoto! Olha só os olhos dele!"
          Somente nesta ocasião é que as madames dos Jardins se lembravam de subir o morro. Não para levar ajuda para os deserdados da vida. Subiam o morro à procura do curandeiro, que era sempre o alvo das peregrinações granfinas: era o terreiro do pai-de-santo que elas buscavam: queriam a bênção dos orixás.
          - "Que belo garoto! Olha só os olhos dele!"
          Ele ria a bom rir, pensando como seriam seus olhos que não podia ver, mas vendo perfeitamente seu corpo franzino, seus braços magros, suas roupas sujas da faina de catar papéis nas ruas, os pés encardidos nas havaianas encontradas (ou furtadas?) num campinho de "peladas" nas imediações.
           Não tenho dúvida nenhuma: se Cristo descesse novamente à Terra, tenho certeza de que nasceria na favela. Brincaria com os outros moleques, subiria na goiabeira, amarraria latas vazias no rabo do gato da vizinha, chuparia cana furtada no quintal do português da quitanda, ou sentar-se-ia na beirada do córrego fétido tentando vislumbrar algum lambari, se isto fosse possível, nas águas viscosas e grossas de detritos lançados indevidamente aí pelas fábricas.
           - "Que belo garoto! Olha só os olhos dele! Não parecem um convite para o amor?"
           Ele então, meio assustado com o repentino entusiasmo erótico das madames, voltaria correndo, entraria no barraco, olharia meio torto para a mãe. Ela certamente, como todas as mães do mundo, adoçando a tristeza do semblante cansado, o fitaria com ternura:
           - "O que é que você tem, menino? Vamos, desembucha..."
           - "Mãe, que é amor?"
           Talvez, sem esperar resposta, ele mesmo se atirasse confiante nos braços maternos, como que respondendo a si mesmo. Entrega. Doação.
           Seria apertado contra o regaço da Mulher. Como uma sacerdotisa, ela o levantaria em seus braços, olhos fitos no Céu:
         - Deus!...

                                             ******************************

        Os problemas de sua vida real incluíam o amor.      Sentia, mas não compreendia. O amor. Estava rodeado era de luxúria.
        - "Como é?... Você não tem uma "mina"  prá se divertir? O que que há: você não é macho? Arranja logo uma, cara, se vira!"
         Tímido, desconfiado, aproximou-se certo domingo de uma menina  que o coração apontava como devendo ser sua. Desajeitado, com medo de um   "fora", coração aos pulos, sussurrou um "olá"  à menina-moça.
         -"Vê se te manca, meu chapa. Vai logo dizendo o que quer. Não ganhei nada ainda hoje, e não tenho tempo prá perder. Quanta grana tem aí?"
       Era dessas moçoilas que transpiram maldade por todos os poros, cujos olhos mostram abismos de lama. Ele procurava amor. Sua primeira experiência foi desilusão. Aquilo não era amor.
         Outro dia foi o ônibus da CMTC. Azar dos feios. Bolsos vazios.  Tentou passar o cobrador para trás, viajar de graça, dizendo que alguém tinha furtado os seus trocados. Mas o homem da catraca já manjava de longe malandragem de pivetes, e não foi na conversa. Esbravejou, ameaçou prender, entregar no Distrito. Mão caridosa se apresentou e pagou-lhe a passagem. O garoto viu o gesto e quis agradecer. Mas faltava-lhe a prática da gratidão. Olhou apenas, fundo, a mão benfeitora. Sentiu um tapinha amigável nas costas e algumas palavras que não entendeu. O barulho do ônibus e do trânsito difícil as encobriu.
         O benfeitor anônimo desceu no próximo ponto. Ele desceu também. Viu-o entrar numa casa diferente, que sabia ser uma igreja. Curioso, furtivo, o rapaz o seguiu. Havia visto muitas casas desse tipo, mas nunca por dentro. Ressabiado, entrou pela porta entreaberta.
         Lá na frente, enorme, dominando tudo, sob a luz forte dos vitrais, o Crucificado.
         A cruz. A Cruz. Quando planejamos, e a imaginação vai adiante, traçando rumos, construindo castelos, colecionando vitórias - o ânimo forte da juventude, o entusiasmo da conquista,  a ânsia de chegar, tudo isto nos abrasa o coração. Alcançar tudo. Em linha reta. Sem desvios. Eis que surgem as barreiras humanas, as oposições, os obstáculos egoístas, os contra. O destino faz-nos estacar, impotentes. Algo cruza a nossa vida, os nossos ideais, e somos crucificados.
         Lá na frente, enorme, dominando tudo, sob a luz forte dos vitrais, o Crucificado.
        Olhos tristes em direção à terra, boca entreaberta como a pedir água, braços e mãos estendidos num gesto de quem recita um poema de dor. Um verdadeiro crucificado, coroado de espinhos, corpo sangrando, lado aberto. Sofrimento. Dor. Doação total.
        Seu pensamento voou rápido para a favela. Aquilo ali, pendurado na cruz, era um homem da favela, ou um símbolo da desumanidade por que passavam seus irmãos de desdita. Teve pena dele. Quem seria? Com dificuldade, soletrou: INRI.
     Avançou um pouco mais, admirando tudo, em descobertas nunca esperadas. Uma grande mesa no centro, com dois castiçais. Ao lado, uma lampadazinha vermelha tremelicando num copo de azeite. O desconhecido que lhe pagara o ônibus passou defronte à mesa. Uma genuflexão simples. Piedosa.
       - "Por quê isso?"
       - "É que ali está o pão sagrado, o corpo de Cristo, a Hóstia santa."
       - "Onde? Posso ver?"
       - "De noite. Na hora da reza."
       De noite não foi para o parque de diversões armado ali por perto. Voltou àquela casa desconcertante, que parecia prometer-lhe grandes revelações.
     Lá estava, junto à mesa, bem debaixo do enorme Crucificado, o homem misterioso, mas agora com estranhas vestes.
       - "Pão?"
       - "Alimento".
       - "Corpo?"
       - "É vida."
       - "Hóstia?"
       - "Hóstia? Hóstia... Não, não sei.
      Altar com velas acesas. Alguma coisa brilhante, parecendo um sol de ouro. No centro, a Hóstia, branca, pequenina. Muita gente de joelhos, cantando.
      - "Só isso?"
      Dentro, porém, no fundo do seu peito, sentia que alguma coisa o roía, parecia que alguém queria falar-lhe, e teve a impressão de que sua vida estaria para sempre, de algum modo ainda obscuro, misterioso, ligada àquela Hóstia que tanto o atraía...

                                                    ***************************

       A perspectiva de um salário perdido pela dura lei do mercado de trabalho, que gera o desemprego, abala todas as estruturas do ser humano, que precisa trabalhar para viver. Quando a hipótese temida se torna triste realidade, injusta, o operário, pai de família, se vê na rua, sem nada, caminhando às tontas, esperando contra toda esperança que amanhã será melhor.
      Talvez lhe apareça um "bico", um dinheirinho para o punhado de feijão com arroz que disfarce a ronqueira dos ventres famintos dos filhos. A necessidade do dinheiro, quase sempre, é a única força capaz de nos violentar e subjugar o amor-próprio. É o hóspede mais esquisito e indesejável que nos chega à porta.  Entra sem bater, não pede cortesias. Antes, obriga-nos a sair, a misturar-nos com os outros, a solidarizar-nos, a procurar, a bater, a pedir, a implorar.
       Ele estava literalmente "duro".  Recomendaram-lhe certo doutor, um deputado, homem rico e com fama de quebra-galho dos pobres. Na sala de espera, a recepcionista distante e fria:
         - "Tem muita gente na frente. Sente-se e espere sua vez."
         Depois, muito mais tarde, o receio, o nó na garganta, o pedido balbuciante e difícil de sair. 
      - "Volte amanhã. Tentarei dar um jeito. Está difícil prá todo mundo. O governo está fazendo o que pode. Tenha mais um pouco de paciência."
       Um ato a mais na vida de todos os dias: um homem anulando outro homem!
       Lá naquela casa estranha, a Hóstia, cercada de gente, não parecia ser assim. Nada de respostas secas. Nada de evasivas. Estava sempre ali, aberta a todos. Negros, brancos, moços, velhos, crianças, homens e mulheres. Todos confiantes. Todos cheios de Fé. Todos simples, na espera do dom que nunca falha.
       - "Pai nosso..."
      -  "Pai nosso?!"

                                            ****************************

       O pão em casa acabou de vez. Tinha ouvido não se lembrava de onde: - "Comerás o pão com o suor de teu rosto."
       Ouvira, sim, mas isso não era com ele. Não trabalhava, não suava: não merecia o pão!
      A lógica dos homens, creio eu, irrita o próprio Deus, que quisera ver revogadas estas palavras. Não são raras as vezes em que a Lei se torna absoluta e perde seu valor de relativo, de meio. Obrigamos, não sabemos criar exceções justas. Não percebemos o desespero que causam tais atitudes intransigentes. É a lei, é a lógica. Há que cumpri-las. Não trabalhou? Não suou? Não tem pão.
     Implorar, humilde, abjeto, o pão de cada dia, e receber como esmola o pão velho de outro dia.
     - "E que será feito do pão sagrado?"
     - "Comido."
     - "Eu tenho água viva..."
     - "Dá-me dessa água."
     - "Quem comer da minha carne..."
     - "Eu tenho fome."
     - "Se conhecesses o dom de Deus..."
     - "O dom de Deus?"

                                          ***************************

      - "Entre! Venha ver que dom têm estas belas criaturas a oferecer! É barato! Elas são bonitas e novinhas! Não têm nenhuma doença! Ah! Se você as conhecesse... Vamos, uma vez só! Não vai se arrepender!
      O ambiente era aquele de que muitas vezes ouvira falar  quando moleque, entre cochichos e risos disfarçados. Luzes semi-acesas, muita fumaça de cigarro, muita bebida, ritmos sensuais, mulheres bonitas quase nuas, se oferecendo, se doando...
     O corpo. A adoração do corpo. Perder a consciência, esquecer a miséria, embriagar-se, deixar-se dominar pelas sensações, com a carne palpitante lhe enchendo a alma!
       Mas, e o Corpo de Cristo? Este sim, era um Corpo diferente, adorado, respeitado, venerado. Nada de profanações baratas. Sim, a dignidade do corpo!
       E a Hóstia, toda branca, toda pura!
       - "Aqui só tem barulho... algazarra..."
       - "Não seja trouxa! Aqui é lugar de alegria, de festa, de prazer!
       - "Mas é tudo muito escuro..."
       - "Eh, meu, no escuro é muito melhor..."
       - "Eu preciso é de luz, muita luz, que ilumine a favela sem sol que sempre foi a minha vida!..."

                                       *****************************

      O volver contínuo de desejos e frustrações, de esperanças e desenganos, sofreu interrupção violenta um dia. A desnutrição, a fome crônica, o frio, o desemprego sem fim, a broncopneumonia, a absoluta falta de recursos no barraco.
     Nada mais havia a fazer. Chegara a hora e a vez de Deus: a celebração da Missa derradeira, a oblação a Deus de seu corpo e de seu sangue.
     O ritmo da favela, aparentemente, não mudou; mas, para quem tinha olhos de ver, a Providência Divina a tornara uma patena, sem ouro, é verdade, pois ali imperava a pobreza. Mas uma patena sublime sobre a qual descansaria a hóstia do sacrifício.
    Morria, repetindo sem cessar:
    - "A Hóstia! A Hóstia!
    Num gesto de pai, o homem misterioso do ônibus, o sacerdote endurecido nas refregas da vida, estreitou ao seu coração um novo Cristo moribundo, o Cristo-favelado.
     - "A Hóstia! A Hóstia!"
     - "Você é que é Hóstia, meu filho! Hóstia é ser vítima, como você sempre foi. É deixar-se imolar... É sofrer por amor de Alguém... do Homem da favela... do Crucificado... de Deus!"
     - "Estou todo sujo... fiz tanta maldade... a Hóstia é branca... sem mancha..."
    - "Você agora é a Hóstia. Deus o limpa e purifica com as lágrimas que você está derramando. Você é o filho que volta!
     - "...a Hóstia!"
    Já nada mais falta. Tudo está consumado. E prossegue a Missa:
  - "Recebei, Pai Santo..."


                                                 ****************************

                                                Se eu pudesse
                                                no momento mais doloroso
                                                do sepultamento de minha filha Raquel
                                                quando a sua urna funerária
                                                era colocada túmulo a dentro
                                                eu faria
                                                com que uma revoada de andorinhas
                                                pairasse sobre os presentes
                                                testemunhando
                                               a sua ressurreição NA morte
                                               que é a Fé que me anima
                                               e me mantém vivo
                                               até hoje
                                               Oh! como seria bom
                                               Se eu pudesse!...

                                               ********************************

    

      





   





         





    

   

    
          

           

domingo, 14 de abril de 2013

RELENDO O LIVRO DO "GÊNESIS"


          No princípio era o Artista. E o Artista criou a Poesia.
         Depois criou o Céu e a Terra com todos os seres que neles existem para a glória da Poesia. Criou o sol e a lua. Criou as estrelas e as nuvens. Criou as fontes, o rio e o mar. Criou o beija-flor, o sabiá e o rouxinol, não se esquecendo de criar as andorinhas. Criou o ar e o vento, para que neles voasse a Poesia sob a roupagem de sons musicais. E criou também a borboleta, a cigarra, a neve e o orvalho.
           Poderoso é o Artista!
       É como uma chama viva sobre cinzas esvoaçantes. É como uma torre altaneira em meio a águas marulhentas. Suas mãos, porém, são delicadas como a fragilidade da neblina, pois souberam modelar as formas sublimes da Poesia, aureoladas pelas estrelas do firmamento.
           Foram estes os primeiros quatro dias da Criação.
        E o sol expulsou a lua, a aurora estendeu seus loiros cabelos por sobre a fímbria do horizonte, as borboletas cortaram o ar, e os ninhos arrulharam nas copas das árvores.
          E o Artista, ainda com flores selváticas nos braços, ainda com os veneráveis cabelos molhados pelo orvalho dos vales primitivos, saiu para contemplar a obra de suas mãos divinas.
           E viu que tudo era bom.
           Somente a Poesia estava triste e melancólica no meio da Criação.
           O Artista, vendo-a triste, perguntou-lhe:
           - "Que tens tu, que te escondes envergonhada entre as obras que criei para ti? Dei-te um mundo de maravilhas sem fim; criei para ti a terra e o mar, as vagas do oceano e o murmúrio das fontes, a rosa e a violeta. Minhas mãos espalham nos ares flocos de neve alvinitente para que neles tu faças o teu sólio. Por que então não reinas sobre o mundo?" 
           Respondendo ao seu Criador, a Poesia sussurrou que estava triste porque nada no mundo criado a amava. Nem o leão, nem o urso, nem a girafa, nem o boi, nem o cavalo, nem a fonte, nem a cascata. Nada havia sobre a Terra que a amasse e a celebrasse.
            O Artista sorriu e Seu sorriso abalou os alicerces do mundo e as colunas que sustentam os sete céus. E falou assim:
            - "Vou criar um ente à minha imagem e semelhança, que te ame como eu. Serás glorificada até os confins da Terra; teus adoradores se multiplicarão como as areias do mar e as estrelas do firmamento."
             Isto dizendo, tomou do cinzel e de um bloco de mármore. No alto do bloco abriu duas cavidades lembrando Seus olhos divinos; mais abaixo outra igual à Sua boca; desenhou as orelhas, afilou o nariz, esculpiu o tronco, os braços e as pernas.
           Afastou-se dois passos, colocou as mãos nos quadris e admirou o Seu trabalho. Achando que era bom, assoprou sobre ele o Seu espírito divino, e surgiu o homem.
           Vendo, porém, que não era bom para o homem estar só, o Artista o fez dormir,   arrancou-lhe do lado um pedaço de sua carne, assoprou também sobre ele, e foi assim que nasceu a mulher.
             E o homem e a mulher prostraram-se diante do Artista e o adoraram.
             E Ele lhes disse:
          - "Eis que eu vos criei unicamente para servirdes à Poesia. Vós devereis amá-la e servi-la fielmente. Ela é a senhora da criação: dos pássaros, dos montes, da dança das folhas, do sol e da chuva, do dia e da noite, do orvalho e dos ventos, das borboletas e das cigarras. Este é um mandamento que eu dou a vós e aos vossos filhos, por todas as gerações, enquanto durar o mundo."
             Este foi o quinto dia do trabalho do Artista. E Ele viu que tudo era bom.
            Passado muito tempo, os filhos dos homens e as filhas das mulheres tiveram outros filhos e filhas. E disseram entre si:
            - "O Artista nos criou a serviço da Poesia.  Para amá-la e servi-la em todos os dias de nossa vida. Vamos, pois, e tomemos as arrecadas de ouro das orelhas de nossas mulheres, de nossos filhos e de nossas filhas, e façamos deles instrumentos musicais para louvar a Poesia".
             E assim foi feito. Vieram outros também, e com o ritmo e a rima trazidos das terras de Ofir e de Golconda, teceram ricas vestes para a Poesia. E ela reinou sobre o mundo, desde as praias do mar, até as fronteiras do grande rio. Seus súditos eram, pela multidão, inumeráveis como as estrelas do Céu. Comiam, bebiam e se alegravam, porque poderosa era a sua Rainha. Ela possuía sob seu domínio todos os homens e mulheres dos quatro cantos da Terra, desde os confins do país dos orientais, até a fronteira dos homens que moram em tendas, no deserto.
           E os tempos correram. E a Poesia se entristeceu, enfarada com a glória que tinha. E disseram os filhos dos homens às filhas das mulheres:
             - "Eis que nossa Rainha está dominada pela tristeza. Façamos novas coisas que lhe  deem alegria. Edifiquemos um altar, e sobre ele lhe ofereçamos incenso e sacrifícios pacíficos."
              O Artista surgiu diante deles numa nuvem de fogo, entre relâmpagos e trovões, e lhes falou:
              - "Ouvi, homens,  ouvi vós também, mulheres, jovens e crianças: ide a todos os recantos da Terra, colhei em vasos de alabastro os sorrisos da Poesia, desde os tempos em que ainda havia sorriso em seus lábios, e eu a farei novamente feliz."
              Vieram então os filhos dos homens e as filhas das mulheres, e puseram mãos à obra. Uns recolhiam os sorrisos da Poesia nos raios do luar, outros nas gotas frias do orvalho, alguns na tepidez dos ninhos, outros mais na brancura alcandorada das geleiras eternas, ou na pureza das crianças, ou na felicidade dos esposos.
              Todos trabalharam, obedeceram todos à voz poderosa do Artista. Colheram os sorrisos da Poesia em vasos de alabastro e entregaram-lhe, para que Ele a tornasse outra vez feliz.  E o Artista tomou os sorrisos da Poesia em Suas mãos, abençoou-os, assoprou sobre eles o Seu espírito divino, e os transformou no Poeta. E falou assim ao Poeta: 
              - "Eis que os filhos dos homens e as filhas das mulheres não souberam amar a Poesia como eu lhes ordenei em mandamento solene. Por isso te criei, Poeta, e tu serás o seu sacerdote em toda a Terra. Vai, pois, e faze-a novamente rainha da criação."
              Foi assim que nasceu o Poeta, dos sorrisos da `Poesia, pelas mãos fecundas do Artista. E este foi o último dia da Criação, e o Artista descansou de Seu trabalho.
              E a Poesia encheu o mundo com a sua luz, quer durante o dia, quer durante a noite, quando o sol vai repousar por trás das grandes árvores do poente.
              Ela tudo alegra e tudo vivifica, torna mais linda a Terra. Sem ela, nada haveria: nem o sol, nem a lua, nem o vento, nem a chuva, nem o mar, nem o homem, nem a mulher. Nada haveria, exceto o Artista, que a tirou de Seu cérebro onipotente, pois a Poesia é o pensamento do artista que desabrochou na Terra e no Céu, criados para ela e para a sua glória.
               Grande é o Artista!
               Grande e eterno é o Artista Sublime, criador da Sublime Poesia!
               A Ele a honra e a glória, por todos os séculos dos séculos, na voz e na magia de todos os Poetas!


                                                     *******************************

A minha oração de todos os dias, de todas as horas, de todos os momentos:

                                                      Se eu pudesse
                                                      na hora mais dolorosa
                                                      do sepultamento de minha filha Raquel 
                                                      quando a sua urna funerária
                                                      era colocada túmulo a dentro
                                                      eu faria
                                                      com que pairasse sobre os presentes
                                                      uma revoada de andorinhas
                                                      testemunhando 
                                                      a sua ressurreição NA morte
                                                      que é a Fé
                                                      que me anima e me mantém vivo
                                                      até hoje
                                                      Oh! como seria bom
                                                      Se eu pudesse!...

                                                    *********************************
                                          
         








              






















           
      
        


























sábado, 13 de abril de 2013

JESUS E A MULHER


          Sabemos pelos Evangelhos que Jesus anuncia o Reino para todos. Não exclui ninguém. Mas o anuncia a partir dos excluídos. Ele recebe como irmão e irmã todos aqueles a quem a religião e o governo desprezavam e excluíam: mulheres, crianças,  doentes, prostitutas, pecadores, pagãos, samaritanos, leprosos, possessos, publicanos, soldados, os pobres, o povo da terra sem poder. Assim, aos poucos, a semente do Reino crescia e desabrochava em novas formas de vida comunitária.
            Esta ação de Jesus a partir e em favor dos excluídos não era uma ação isolada, só dEle. Havia muita gente que não concordava com a exclusão, e que vinha resistindo há séculos. Jesus se insere nesse movimento de resistência popular e lhe dá continuidade e orientação. Um exemplo concreto desta afirmação é a Sua atitude com relação às mulheres.
            Na época do Novo Testamento, a marginalização da mulher era um dos fatores principais a causar a exclusão dos pequenos. A mulher vivia marginalizada pelo simples fato de ser mulher. Na sinagoga ela não participava, na vida pública não podia ser testemunha. Muitas mulheres, porém, resistiam contra a exclusão.
          Já desde os tempos de Esdras, no período depois do exílio, quando a marginalização da mulher era mais pesada, sua resistência vinha crescendo, como transparece nas estórias de Judite, Ester, Rute, Noemi, Suzana, da sulamita e outras. Esta resistência encontrou eco e acolhida em Jesus.
           Eis alguns episódios, em que transparecem o inconformismo e a resistência das mulheres no dia-a-dia da sua vida e o acolhimento que Jesus lhes dava. 
          A moça, prostituída, tem coragem de desafiar as normas da sociedade e da religião. Ela entra na casa de um fariseu para encontrar-se com Jesus. Encontrando-O, encontra amor, perdão e recebe defesa por parte de Jesus contra o fariseu. A mulher encurvada não se importa com os gritos do dirigente da sinagoga. A mulher considerada impura por causa do fluxo de sangue tem a coragem de meter-se no meio da multidão e de pensar exatamente o contrário da doutrina oficial. A doutrina dizia: "Se eu tocar nEle, Ele ficará impuro!" Mas ela dizia: -"Se eu tocar nEle, ficarei curada!"
       Ela é acolhida sem censura e curada. Jesus declara que sua cura é fruto da fé. A samaritana, desprezada como herética, tem coragem de interpelar Jesus e de mudar o rumo da conversa por Ele iniciada. Ela é a primeira pessoa a conhecer o segredo de que Jesus é o Messias.
         A mulher estrangeira da região de Tiro e Sidônia não aceita a sua exclusão e sabe argumentar de tal maneira que consegue mudar a atitude de Jesus e ser atendida por Ele,
         As mães com filhos pequenos enfrentam os discípulos e são acolhidas e abençoadas por Jesus. As mulheres que desafiaram o poder romano e ficaram perto da cruz de Jesus foram as primeiras a experimentar a presença de Jesus ressuscitado. Entre elas estava Maria Madalena, considerada possessa, mas curada por Jesus. Ela recebeu a ordem de transmitir a Boa Nova da ressurreição aos apóstolos.
          Na verdade, nossos pensamentos e atitudes sempre foram opostos ao pensamento e às atitudes de Jesus, em toda a Sua vida pública nos caminhos da Galiléia.!...

          


quinta-feira, 11 de abril de 2013

Rememorando Gandhi





        Um lembrete preliminar para o Carlão, a modo de questionamento:


 Se Deus pode evitar o mal e não o faz, então Deus não é bom. Se quer evitar o mal, mas não pode fazê-lo, então não é onipotente. Se quer e pode evitar o mal, mas não o faz, então Deus não nos ama.
(Este é o dilema que uma amiga, com quem me correspondo, me propôs. Como sair dele?)

                                                             *****************

          Dizia Gandhi, no seu tempo, que cumpre a cada homem e mulher, tementes a Deus, dissociarem-se do mal na mais completa despreocupação pelas consequências. É preciso ter fé no fato de que um ato bom só pode produzir um bom resultado... Segue a verdade, embora segui-la possa pôr em perigo sua vida. Sabe que é melhor morrer no caminha de Deus, do que viver no caminho de Satanás
.     Esta é precisamente a atitude que perdemos cá no Ocidente, porque perdemos a perspectiva fundamentalmente religiosa da realidade, do ser e da verdade. Nós no Ocidente sacrificamos a capacidade de aprender e respeitar o que são o homem e a mulher, o que é a verdade, o que é o amor desinteressado, e substituímos tudo isso por uma vaga confusão de noções pragmáticas sobre o que pode ser feito com isto ou aquilo.
           E o fazemos, considerando o que é lícito, o que é realizável, como podem as coisas ser empregadas, independentemente de qualquer sentido definido ou finalidade contidos em sua própria natureza, expressando a verdade e o valor dessa natureza.
  Só nos preocupa o lado "prático", "eficiente",  isto é, os meios, não os fins. Consequentemente, interessam-nos cada vez mais apenas as consequências imediatas. Somos os prisioneiros de tudo o que é urgente. Assim perdemos a tal ponto toda perspectiva e todo sentido dos valores, que não somos mais capazes de avaliar corretamente que resultado terão as consequências até as mais imediatas de nossos atos.
        Entretanto,  quando se    opta pelo bem sem preocupação pelas consequências é, de fato, um paradoxo que as consequências sejam, por fim, boas e que o bem nelas contido há de superar, de muito, o mal possível.
         A norma de Gandhi é a norma do Novo Testamento: realizar todas as coisas em nome da verdade, em nome de Cristo, isto é, por amor da verdade nelas contida, que é a manifestação de Cristo. Agir por amor à verdade ,  "realizando a verdade na Caridade", é agir unicamente pela verdade, sem preocupar-se com as consequências.
          Isso não quer dizer que se faça estouvadamente o que pareça ser a verdade sem se importar com um possível desastre, mas sim que se opta pelo que se acredita ser boa escolha e depois se deixa que o bem produza as boas consequências em tempo oportuno.
          Em tempos como os nossos, é mais do que nunca necessário ao indivíduo formar-se, ou ser formado, de acordo com normas objetivas do bem, e aprender a distingui-las das normas puramente pragmáticas correntes na sociedade em que vive. Assim, chegará a conhecer a diferença que há entre "os caminhos de Deus e os caminhos de Satanás".
         Temos de recobrar nossa Fé íntima, não somente em Deus, mas no bem, na realidade do bem e em seu poder para se manifestar concretamente e nos envolver se soubermos ser atentos, observar, escutar, escolher e obedecer.
         Contar com Deus, evidentemente, não significa passividade, Pelo contrário. Liberta homem e mulher para uma atividade nitidamente definida, "a vontade de Deus". Isto, nas palavras de Gandhi, é "ação inteligente de um modo desapegado". Deus quer ver-nos agir por amor a Ele, por amor à verdade, não por preocupação com interesses materiais imediatos. Assim, quer ver-nos agir "desapegadamente". 
          O desapego não é pura indiferença, mas apenas concentração da ação no sujeito do próprio ato, não nos resultados ou nas consequências. Somos responsáveis apenas por nossa ação, mas devemos assumir inteira responsabilidade por nossos atos. Os resultados virão por si mesmos, então, de um modo que nem sempre poderemos prever.
         Temos apenas que julgar se o ato é bom, justo, e se está de acordo com a verdade e o amor, aqui e agora, porque "acreditamos no bem" e estamos, por isso, convencidos de que, sejam quais forem as consequências que sobrevierem, serão certamente boas, benéficas a nós e à sociedade.

                                                              ***********************************

                                                              Se eu pudesse
                                                              na hora mais dolorosa
                                                              de sepultamento de minha filha Raquel
                                                              quando a sua urna funerária
                                                              era colocada túmulo a dentro
                                                              eu faria com que
                                                              uma revoada de andorinhas
                                                              pairasse sobre os presentes
                                                              testemunhando
                                                              a sua ressurreição NA morte
                                                             como é a Fé
                                                             que me anima e me mantém vivo
                                                             até hoje
                                                             Oh! como seria bom
                                                             Se eu pudesse!...

                                                            ************************************